14/01/2017 às 13h58min - Atualizada em 14/01/2017 às 13h58min
“Catanic
Por Luciano Baía Meneghite - LUC
Sábado, 11h30min. No entupido ponto de ônibus da Carlos Luz. Não sei quantos graus estava a temperatura, mas se o inferno existir deve ser parecido. Como disse uma senhora, passava ônibus até pro inferno, mas o que esperava não vinha.
“Os últimos serão os primeiros!” dizia uma crente.
“Só se forem os primeiros a morrer de calor.” Respondeu uma gorda de minissaia se abanando com folheto de propaganda do Fonte supermercado.
Depois de uns quarenta minutos começam a chegar os “cataniquel's” ou “catalixo” como diz uma vizinha.
Do outro lado da rua, uma risada escandalosa. É o Chico Doido com sua bicicleta de compras. Atravessa a rua e vem dar seus socos nos pneus dos ônibus seguidos de suas tiradas filosóficas.
Uma dona passa entregando bilhetinhos em que pede auxílio. Depois volta recolhendo os papéis e algumas moedas. Um vendedor passa vendendo meias. Com aquele calor dava até arrepio pensar em meias. E passa um vendedor de rifas 171, passa um bêbado arrastando um saco, uma mãe arrastando uma criança remelenta e um velho arrastando os anos.
Enfim chega o ônibus. Mal para no ponto e a velharada se amontoa na porta. Dentro do veículo uma quantidade igual querendo descer. Depois de algumas cotoveladas, bolsadas, bengaladas e muletadas, todos se acomodam como sardinhas em lata. Na cadeirinha cativa da frente aquela senhora emburrada que mora dentro do ônibus e não levanta nem pra paralítico.
Nunca entendi por que não deixam os idosos com direito ao passe livre entrarem pela porta de trás. Seria bem mais fácil.
O ônibus arranca e na arrancada algo cai no chão. A trocadora avisa pro senhor careca na sua frente, freqüentador do forró do Pró Idoso:
- Sr. Fulano sua lingüiça caiu.
- Não é minha não.
- É sim. Eu vi escorrer da sua calça.
O ônibus cai na gargalhada e uma velha quase cai na escada.
O Senhor careca fecha a cara e joga a lingüiça pela janela. Dois vira-latas se enroscam pelo petisco.
O ônibus chega à Praça do urubu. Descem três e sobem doze.
A sauna de rodas começa a subir o moro do Pirineus. Dá umas rateadas, mas segue até o Chafariz. No trajeto a gorda de minissaia começa a discutir na maior altura com alguém no celular.
- O quê? Aquela vagabunda? E o quê você fez? Num brinca! Sério?
O povo amontoado olha curioso.
- Eu tenho que te falar um negócio... Não...Péra...Deixa eu falar...
Na Praça do Chafariz desce metade dos passageiros, aliviados, mas curiosos pelo desfecho da conversa.
Uma amiga magrinha envergonhada cutuca a gorda, mas ela continua brava e pingando suor.
-Tô chegando aí. Cê vai ver o que eu vou fazer.
A dona na cadeirinha da frente resmunga alguma coisa.
Outra passageira a responde.
Parece outra briga iniciando.
Desço na Cohab Velha, sem saber o final da história.