09/03/2017 às 08h07min - Atualizada em 09/03/2017 às 08h07min

Câmara de Leopoldina debate a transformação do Dia da Consciência Negra em feriado

As manifestações durante a audiência pública foram norteadas pela discussão sobre a constitucionalidade ou não do referido projeto de Lei.

Arnaldo Spindola – Assessoria de Imprensa
O Poder Legislativo de Leopoldina realizou sua primeira audiência pública na atual legislatura. A reunião especial aconteceu no dia 23 de fevereiro, no Salão Nobre da Câmara Municipal, com a presença de diversas entidades, associações, conselhos e integrantes do movimento negro de Leopoldina que discutiram sobre o Projeto de Lei nº 01/2017, que “Institui feriado municipal no dia 20 de novembro, em comemoração ao Dia da Consciência Negra e dá outras providências”, de autoria do vereador Rosalvo Domiciano Frauzino.

Além do vereador Darci José Portella, que presidiu a reunião, também compareceram os parlamentares Kelvia Raquel, Waldair Barbosa Costa, Elvécio de Souza Barbosa, Valdilúcio Malaquias, Rogério Campos Machado, Sebastião Geraldo Valentim, José Ferraz Rodrigues, Jurandy Fófano Vieira e Rosalvo Domiciano Frauzino. O Poder Executivo esteve representado pelo Vice-Prefeito Márcio Henrique Alvarenga Pimentel.

No início da audiência foi promovida a apresentação do Grupo Pérola Negra, um projeto social criado há quatro anos na Escola Municipal Judith Lintz, trabalhando com jovens e adolescentes através da dança, artesanato, capoeira e percussão.

As manifestações durante a audiência pública foram norteadas pela discussão sobre a constitucionalidade ou não do referido projeto de Lei. Inicialmente, o advogado Wesley Moraes Botelho, representando a Assessoria Jurídica da Câmara, explanou sobre o tema.  O advogado fez referência a diversas histórias que remetem a exemplos de preconceitos não somente contra a raça negra, mas também contra os pobres, as mulheres, os homossexuais, entre outros.

Em relação ao projeto, Dr. Wesley Botelho informou que a legislação federal faculta aos municípios considerar quatro feriados religiosos e os demais cabe ao Governo Federal. Em Leopoldina, a Lei Municipal nº 1636 estabelece quatro feriados: aniversário da cidade, Corpus Christi, São Sebastião e sexta-feira da paixão. Ele explicou que somente a União pode legislar sobre feriados, pois mexe com a relação de trabalho, emprego e remuneração. O assessor frisou que o feriado não pode ser decretado pelo município, por ter implicações na área civil e trabalhista. O advogado reconheceu que algumas cidades decretaram o feriado da consciência negra no dia 20, mas, mediante contestação judicial, a lei perdeu a vigência.

Wesley Botelho encerrou sua fala ratificando que esta iniciativa é inconstitucional e sugeriu instituir uma data comemorativa no dia 20 de novembro com a realização de debates sobre o tema.

O vereador Rosalvo Domiciano Frauzino, autor do requerimento para realização da Audiência Pública, disse que não esperava a manifestação contrária da Assessoria Jurídica, mas ressaltou que é importante lutar pelo projeto e solicitou publicamente o apoio dos membros da Comissão de Constituição, Legislação e Redação.

Entre os manifestantes na audiência, o advogado Wagno Rocha Antunes citou números que mostram a condição subalterna dos negros na atualidade e que revelam a desigualdade racial presente nas relações sociais no país. Ele citou que o município de Leopoldina, no século XIX, teve um grande contingente de escravizados e que há alguns anos havia espaços segregados onde os negros não podiam frequentar, permanecer e transitar. O advogado defendeu que o projeto de lei promoverá uma reparação e uma justiça histórica com a população negra, já que a data faz uma referência à morte de Zumbi, líder da odisséia libertária do Quilombo dos Palmares, em cuja figura a população negra se reconhece, enaltece-se, eleva sua autoestima e sente-se valorizada.

Sobre a constitucionalidade da matéria, Wagno Antunes citou o Supremo Tribunal Federal que já analisou a referida matéria e entendeu que cabe ao município legislar sobre assuntos de interesses locais. Ele ressaltou que há decisões que afirmam que ela é constitucional, citando como exemplo o fato de a 4ª turma do Superior Tribunal do Trabalho, em 2015, ter concluído pela constitucionalidade do feriado municipal no dia 20 de novembro em São Paulo, instituído pela Lei 14485. O advogado ainda acrescentou que tramita no Congresso Nacional o Projeto de Lei nº 296/15 que determina que o dia 20 de novembro seja feriado nacional e já recebeu parecer favorável por unanimidade da Comissão de Constituição e Justiça e Cidadania da Câmara Federal.

Em seguida, sucederam-se vários debatedores que se debruçaram sobre o tema, apresentando exemplos para justificar suas posições. Durante toda a reunião, foram apresentados dados estatísticos para comprovar a desigualdade existente no país, uma realidade constatada por estudos e pesquisas. Em vários momentos foram enaltecidas as ações desenvolvidas pelo movimento social negro, destacando o Clube dos Cutubas e o Conselho Municipal da Igualdade Racial. Eles defenderam ser necessário construir relações sociais pautadas no respeito à diversidade, nas quais atos como racismo e discriminação não sejam tolerados. Os manifestantes comentaram que o feriado de 20 de novembro possibilitará a realização de diversas atividades que levarão a uma reflexão mais profunda sobre o nível e a qualidade das relações raciais, com vista a superar o DNA da desigualdade racial que ainda persiste no país. Foi lembrado pelos presentes que Leopoldina teve um grande contingente de escravizados e que chegou a hora de a cidade se reconciliar com o seu passado, reconhecendo a importante participação da raça negra no seu desenvolvimento econômico. Os participantes reconheceram a importância da audiência pública, por tratar de um tema antes considerado como interditado, sobre o qual não se podia falar abertamente. Por isso, eles consideraram que já era uma grande vitória da luta antirracista.

Ao final dos debates, a reunião foi encerrada pelo presidente que convidou a todos a rezarem a oração do Pai Nosso. 

Fonte: Portal da Câmara Municipal de Leopoldina


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