04/04/2017 às 21h20min - Atualizada em 04/04/2017 às 21h20min

“ Eu não votei na Dilma"

Desapontamento com o ‘impeachment’ e com o Vice Temer

Plínio Fajardo Alvim

Decepcionados com os desdobramentos da destituição de DilmaRoussef e com os rumos tomados pelo governo do substituto, Temer, além de insatisfeitos com o caos e o retrocesso instalados no país, em todas as áreas, sem exceção, desde a posse dele na Presidência, é assim, com essas palavras,“Eu não votei na Dilma!”, que reagem aqueles que apoiaram o impeachment da Presidenta da República. É como se, desapontados, tentassem justificar o seu arrependimento, sob a alegação de que, por não terem votado em Dilma, também não votaram no então candidato a Vice-presidente, integrante da “Chapa Dilma-Temer”.

            É bom lembrar que o voto em candidato a “Vice”, da maneira como ocorre hoje, é fruto, pura e meramente, de exigência da legislação eleitoral vigente, que vale para os três níveis do Poder Executivo – o federal, o estadual e o municipal. O voto é vinculado; não dá para separar os votos dados ao candidato ao cargo de Titular dos votos dados ao candidato a Vice de uma mesma “Chapa”. Não há como não votar na "Chapa" completa, a menos que o voto seja “Branco”, “Nulo”, ou que o eleitor não vá às urnas–e também nesses casos, o efeito impactará o resultado da “Chapa” como um todo.

            E quem, de fato e na prática, catalisa este processo - de atração dos votos - é o candidato ao cargo principal, o chamado "Cabeça de Chapa". Por questões de articulação e estratégia políticas, conjunturais e circunstanciais, nem sempre há uma chamada "Chapa puro-sangue" - com candidatos do mesmo partido; razões por que aparecem as chapas compostas por candidatos de partidos distintos, com o apoio das coligações.

            Como todos sabem, ou deveriam saber, a legislação eleitoral passou - e ainda passará - por muitas modificações. Já houve períodos, alguns não muito distantes, em que, por exemplo:

            - o voto ao candidato a Vice-Presidente era desvinculado do voto ao candidato à Presidência;
          - era obrigatória a vinculação do voto em candidatos do mesmo partido (para governadores, vice-governadores, senadores, deputados federais e estaduais; e também para prefeitos, vices e vereadores);
            - as mulheres, os escravos e os analfabetos não podiam votar;
            - só os homens, maiores de 25 anos e com renda superior a determinado valor é que poderiam votar;
            - havia eleição para eleger/habilitar eleitores que pudessem votar; etc.

            Houve até, em 1955, uma proposta (não aprovada) de alteração da legislação eleitoral, sugerindo que, após o exercício do voto, o eleitor deveria ser marcado, no dedo mínimo da mão esquerda, com uma tinta que tivesse durabilidade mínima de 12 horas. Ironicamente, quase cinquenta anos depois, o Presidente que foi eleito, Lula, não tinha o dedo mínimo da mão esquerda. Já pesquisei e escrevi sobre isto, em longo artigo, “Angustura, Além Paraíba e Leopoldina na Novembrada de 1955 – Carlos Luz na Presidência da República”, publicado em várias mídias e plataformas – no JornalLeopoldinense também.

            Aquela foi também uma passagem muito conturbada e controversa da história política brasileira, que, a propósito, teve alguns episódios bem semelhantes aos do atual momento. Inclusive, com impeachment de um Presidente da República (Café Filho, o Vice que assumira a Presidência, após o suicídio do titular, Getúlio Vargas), e a saída de um Presidente da Câmara dos Deputados, Carlos Luz, substituto interino de Café Filho, que adoecera.Luz e Café foram acusados de tramar um ‘golpe’ contra a posse de Juscelino Kubistchek, eleito em outubro daquele ano, para assumir em janeiro de 1957. Uma ‘quartelada’, comandada pelo Marechal Lott, tirou Luz do lugar de Café Filho; e o deputado acabou renunciando à Presidência da Câmara. Já recuperado do mal que o acometera, Café Filho tentou voltar à Presidência, para cumprir o final do seu mandato, mas, seu pleito foi negado pelo Supremo Tribunal Federal.

            E é interessante observar como a história política, recente, do Brasil, é recheada de váriasoutras ocorrências que envolvem a saída de Presidentes da República e a posse – ou não – de seus respectivos Vice-presidentes.Nas eleições de 1960, Jânio Quadros foi eleito Presidente da República e João Goulart, o Jango, de outra “Chapa”, foi eleito Vice-presidente. No ano seguinte, em agosto, Jânio renunciou, mas, o Vice não assumiu a vaga por ele deixada, devido a uma manobra político-militar que, para impedi-lo de chegar à Presidência, instituiu o Parlamentarismo no Brasil. E Jango só assumiria a Presidência em setembro, junto com o “Primeiro Ministro”, deputado Tancredo Neves. Em 1963, o sistema parlamentarista foi rejeitado, através de um plebiscito, e Jango recuperou a totalidade de suas funções presidenciais. Mas, em 31 de março de 1964, ocorreria o golpe contra a democracia, que tirou Jangodo Palácio do Planalto e implantou a ditadura militar no país.

            Alguns anos depois, em 1969, ainda sob o regime ditatorial militar, o “Presidente” Mal. Arthur da Costa e Silva, doente (teria sofrido um AVC), não foi substituído pelo “Vice”, civil, Pedro Aleixo. Em seu lugar assumiu uma “Junta Governativa Provisória”, composta pelos ministros militares do Exército, da Marinha e da Aeronáutica, e que governou o país até a posse do Gal. Médici.

            Tem também a história, inusitada e quase surreal, daquele outro “Vice”, Sarney, que, em 1985, acabou assumindo a Presidência, por causa da diverticulite que impediu um "Cabeça de Chapa", Tancredo, de assumi-la. E Tancredo acabou morrendo, sem ser empossado, ficando o "Vice" como Presidente. Ora, se o titular da Chapa, eleita indiretamente pelo Congresso, não assumiu, ele não era o Presidente e o cargo ficaria vago. Portanto, o seu “Vice” era, na verdade, um "Vice de nada e de ninguém"; e não poderia assumir - nem como interino. O Presidente da Câmara, sim. Mas, as articulações e estratégias, que não são objeto destas minhas observações, levadas a efeito pelo Deputado Ulysses Guimarães, então Presidente da Câmara, possibilitaram a posse do "Vice de nada e de ninguém", Sarney, como Presidente da República.

            E vale salientar que, em 1992, Fernando Collor de Mello também foi destituído da Presidência da República, assumindo em seu lugar o Vice, Itamar Franco, que, quando eleito, integrava o mesmo partido de Collor, mas, posteriormente, e antes do impeachment daquele, filiou-se a outro partido, por divergir do titular quanto à condução do país. Itamar fez um bom governo – foi o criador do Plano Real, entre outras medidas que tomou, de caráter nacionalista e desenvolvimentista.Lembrando também que, em 1989, no pleito que os elegeu, assim como ocorreu com Temer nas eleições de 2014 (com a chapa Dilma-Temer), pouquíssimos votos teriam sido direcionados ao candidato a Vice, Itamar Franco, da “Chapa Collor-Itamar”. Quem, sem dúvida, mais atraiu um imenso volume de votos foi o então candidato a Presidente, “Cabeça de Chapa”, Fernando Collor.

            Voltando aos acontecimentos atuais, penso que tenha havido um enorme engano na estratégia adotada pelo partido da Presidenta Dilma, ao compor a sua Chapa com o candidato a Vice, Temer. Mas, como sempre digo, é óbvio que os governos do seu partido cometeram também outros graves erros.

            Contudo, sabemos todos, somos, como nação, ainda neófitos, enquanto participantes de uma democracia- alguns dos acontecimentos mencionados acima o comprovam.E, numa democracia, os erros devem ser avaliados e sanados pela via democrática e não de forma impositiva ou de legalidade discutível, nitidamente parcial, seletiva, manipulada e pseudodemocrática, como temos visto. É por isso, penso eu (e cada um pensa o que quiser, mas, que tenha argumentos com um mínimo de embasamento e fundamentação), que não devemos aceitar e concordar com o retrocesso que está sendo implantado no país, desde a posse do substituto da Presidenta Dilma, jogando no ralo todos os avanços e conquistas havidas nos últimos governos, em todas as áreas (sociais, políticas e econômicas); perdas que só beneficiarão os verdadeiros “donos do poder”, em detrimento do futuro do Brasil e dos brasileiros.

 


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