02/08/2018 às 18h33min - Atualizada em 02/08/2018 às 18h33min

Uma velha Fábrica de Saudades

Maria José Baía Meneghite (*)
Companhia Fiação e Tecelagem de Leopoldina
Por Maria José Baía Meneghite (*)

Quando minha família veio para Leopoldina, começamos uma nova vida, bem diferente da que levávamos na cidade de Ubá onde morávamos.

A mudança, a casa mais humilde, novos amigos e a cidade que nos acolheu com carinho...Carinho...curioso, vínhamos de uma cidade denominada “Ubá, cidade carinho” e justamente aqui, nós o encontramos em larga escala. Isso muito facilitou o processo de adaptação de toda família. Aprendi desde os sete anos, quando aqui cheguei, a gostar desta terra e não a troco por nada.

Acompanhei seu desenvolvimento e também assisti com tristeza a decadência de vários segmentos de sua economia. Entre as inúmeras lembranças está a velha fábrica de tecidos, com sua chaminé enorme cuspindo fumaça como um dragão. Era assim que na minha cabecinha de criança eu a via.

Além da chaminé, o apito marcando os turnos de entrada e saída das operárias, como no samba de Noel Rosa “feria os ouvidos”, mas junto com o batido dos tamancos das operárias, sonorizavam toda a extensão da Rua Vinte Sete de Abril.

Bons tempos, abençoados apitos que anunciavam trabalho e prosperidade. A vida era mais simples como simples também era ser feliz. Sinto saudades mas também trago na memória toda a tristeza quando alguns anos mais tarde ocorreu o fechamento daquela indústria da qual dependiam centenas de famílias. E então, as portas do imenso prédio ficaram fechadas por longo tempo como se ele guardasse as mágoas e sonhos dos que nele trabalharam.

O tempo passou e nova indústria lá se instalou tentando resgatar a dívida da cidade para com uma população que foi forçada a se desprender de suas raízes, ir para outras cidades, tentar novos caminhos...

Infelizmente, o sonho não durou muito e as portas se fecharam novamente. Corria o tempo e o majestoso prédio lá estava fechado ainda guardando os mesmos sonhos e, toda vez que eu passava por lá sentia uma inexplicável nostalgia, saudade, tristeza, sei lá o quê.

Quando fiquei sabendo que mais uma vez a velha fábrica reabriria para abrigar indústrias de pequeno porte pensei: ainda bem que nesse mundo de tantas atitudes individualistas existem pessoas interessadas em resgatar sonhos.

E lá está ela, a velha Fábrica de Saudades, hoje denominada CEDEL, atualmente em sua maior parte ocupada por uma confecção que emprega uma boa parte da população.

Quanto à saudade, quem de nós que viveu e acompanhou as diversas fases do nosso município pode gabar-se de não conservá-la?

Tenho sim, muita saudade de ti minha querida Leopoldina de outras décadas, mas não quero que a saudade seja um entrave para impedir-me de acompanhar seu progresso, mesmo que ele venha aos pouquinhos, devagar, em pequenas doses.
 
(*) Membro da Academia Leopoldinense de Letras e Artes, titular da Cadeira nº 9, cujo patrono é Antônio Sérgio Lima Freire ‘Serginho do Rock’
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