27/12/2018 às 22h37min - Atualizada em 27/12/2018 às 22h37min

O Direito e as Novas Tecnologias: a inteligência artificial como novo paradigma para efetividade da Justiça.

Dr. Edmundo Gouvêa Freitas
(...)Com certeza, toda atividade humana cobra seu tempo, porque o homem carece de imediatidade onipresente que é própria da eternidade de Deus. Mas o tempo de toda atividade humana – e também a processual – necessita inexoravelmente para desenvolver-se, não há que tomar desculpas fáceis para o ócio, o formalismo ou a despreocupação que matam o tempo(...).(MORELLO, Augusto M. El processo justo. 2. ed. La Plata: Libéria Editora Platense, 2005, p. 435)
 
Pela primeira vez, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) julgou mais de meio milhão de processos durante um ano. Em 2018, foram analisadas 511.761 ações, indicando a média de 15.508 para cada um dos 33 Ministros, ou seja, 1.402 julgamentos por hora, ou ainda, 58 decisões por hora. Como se nota, é praticamente um processo por minuto sendo julgado no STJ.

Nesse passo, em sessão inédita da 8ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), em 07 de novembro de 2018, com apenas um click no computador, foram decididos um total de 280 processos. Assim, em menos de 01 segundo, todos os processos foram julgados.Este julgamento somente foi concluído de forma célere devido a utilização de uma ferramenta eletrônica denominada “radar” – que identificou e catalogou recursos com pedidos idênticos.

Diante disso, propõe a seguinte reflexão: A explosão de litigiosidade está obrigando o Poder Judiciário a se reinventar?

Torna-se imperioso o papel crítico da Academia, no sentido de que as Instituições de Ensino Superior que ofertam Cursos de Direito restam obrigadas ao hábil desenvolvimento discente na trilogia: ensino, pesquisa e extensão.

Há que se relatar a dificuldade da docência, quando afastada de instrumentos didáticos-pedagógicos voltados para produção científica, em consolidar visões críticas sobre os vícios das diversas funções operadas no sistema jurídico como diagnóstico da baixa eficiência dos instrumentos tradicionais de pacificação social.

Desta forma, carecem de robustos investimentos materiais e humanos a Magistratura, o Ministério Público e a Defensoria Pública, bem como a Advocacia também deve ser radicalmente aperfeiçoada.

O volume excessivo de trabalho dos Magistrados (7,2 casos por dia útil); restrita agenda e insuficiente verba orçamentária para projetos de educação continuada impactam na qualidade das decisões. A insatisfatória estrutura (física e econômica) não permite ao MP cumprir com alto grau de eficiência sua função institucional. A Defensoria Pública, por razões de orçamento, não consegue atender o assistido com isonomia eproporcionar ao cidadão hipossuficiente umserviço jurídico sequer assemelhado do mais simples expedientedos Escritórios de Advocacia privados.Por fim, o grande número de operadores do direito disponíveis no mercado resultam na avidez desmedida dos Advogados, utilizando a Jurisdição Estatal para resolver questões que, certamente, teriam melhor e mais célere resultado através de Métodos Alternativos de Solução de Conflitos.

Neste contexto não é razoável a eleição de exclusivos culpados, pois as pesquisas etnográficas revelam uma patologia conjuntural relacionada à manutenção das estruturas de poder em meio ao conflito das classes sociais, sendo responsáveis, indubitavelmente, todos atores deste complexo cenário.

Em remate, retomando a ideia vestibular, é perfeitamente perceptível um movimento de regionalização dos Meios Adequados de Solução de Controvérsias, em especial, impulsionados pela implantação de Startups (LAW TECHs ou LEGAL TECHs) integradas às Câmaras de Conciliação, Mediação e Arbitragem, adaptando o caso concreto aos instrumentos consensuais como: Negociação; Mediação; Conciliação; Arbitragem; Dispute Board; ClaimResolutionFacilities, além de outros meiospropícios de solução de conflitos.

Estão em pleno desenvolvimento softwares que utilizam algoritmos capazes de identificar interesses comuns relatados pelos partícipes do processo, culminando em soluções harmônicas para as partes envolvidas em determinado litígio.

O Código de Processo Civil 2015, trouxe em sua sistemática reconhecidas técnicas de julgamento em bloco. Os Tribunais têm aperfeiçoado ferramentas tecnológicas objetivando a diminuição das taxas de congestionamento das Cortes de Justiça (1º grau: 74%; 2º grau 54%). As Câmaras Privadas de Solução de Demandas têm inovado quantoaos mecanismos de tecnologia da informação e inteligência artificial de modo à cooperar com o Poder Judiciário para diminuição de processos em tramitação pendentes de solução no Brasil (80 milhões – segundo o Relatório Justiça em números 2018 \ CNJ).

É preciso enfatizar que o Judiciário não mais apresenta-se como a única via adequada para solução de controvérsias. Diante do Princípio da Inafastabilidade do Poder Jurisdicional e Direito de Petição – constitucionalmente assegurados –, não há demanda que não possa ser submetida à apreciação pelo Estado-Juiz. Contudo, o Advogado – que, em geral, recebe a incumbência de patrocinar a causa, deve ponderar com melhor qualidade técnica sobre a natureza da pretensão de seu cliente e verificar, se é possível e viável, a utilização prévia da via extrajudicial.

Em última análise, a efemeridade das relações na sociedade complexa não mais se adequa ao vetusto tempo do processo judicial tradicional, devendo tornar-se mais relevante a oportuna responsabilidade das novas gerações de estudantes de direito radicadas na Academia – leia-se: nas Faculdades de Direito pátrias, para o fomento e incremento de propostas institucionais compatíveis com a adequada formação profissional e hodierna ideologia processual.

Edmundo Gouvêa Freitas é Mestre em Hermenêutica e Direitos Fundamentais, Especialista em Direito Processual Contemporâneo,Professor Universitário (MG e RJ), Autor de diversas publicações científicas, Árbitro, Mediador e Consultor Jurídico.
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