A frase que intitula o artigo que hora escrevo é de Carlos Alberto Libânio Christo, o Frei Betto (doravante FB), parte de um texto publicado por Leonardo Boff nas redes sociais sobre o Centenário de nascimento de Paulo Freire, em que ele reproduz um texto do primeiro, argumentando ser o frei dominicano um dos maiores conhecedores de Paulo Freire (doravante PF). Em artigo anterior a este intitulado “Paulo Freire: o Deus e o Diabo na terra da ignorância intelectual”, publicado neste jornal no último dia 22, referi-me ao fato de que PF era um educador muito à frente de seu tempo e que enxergava muito além. A seu modo, ele já discorria sobre temas que hoje nos é apresentado como recentes.
Cada vez que leio alguma de suas obras, identifico trechos que falam de identidade cultural, inclusão e até mesmo de arte-educação, de educação ambiental, apenas para citar alguns exemplos. Mas sobre o espírito visionário de seu amigo pessoal, FB disse mais, bem mais, atribuindo à PF o nascedouro de vários movimentos populares.
Reproduzo aqui parte de seu texto: “Posso afirmar, sem receio de exagerar, que Paulo Freire é raiz da história do poder popular brasileiro nos 50 anos entre 1966 e 2016. Esse poder surgiu como árvore frondosa, da esquerda brasileira na segunda metade do século XX: grupos que lutaram contra a ditadura militar (1964-1985); as Comunidades Eclesiais de Base das Igrejas cristãs; a abrangente rede de movimentos populares e sociais despontados nos anos 1970; o sindicalismo combativo [...]”.
FB é contundente ao defender que “Sem a metodologia de educação popular de Paulo Freire, não haveria esses movimentos, porque ele nos ensinou [...] a ver a história pela ótica dos oprimidos e torna-los protagonistas das mudanças na sociedade”. O frei dominicano atribui ao método Paulo Freire, que ele mesmo foi um dos disseminadores, o surgimento de lideranças políticas, sobretudo oriundas do meio operário.
Em suas andanças mundo afora em outros tempos, mais precisamente no México, FB foi indagado porque o Brasil teria um setor de esquerda atuante, com movimentos na Igreja, nos sindicatos..., ao que ele respondeu:
“Comecem fazendo educação popular [...]”. Com base nas palavras de FB, é possível afirmar que o legado de PF não se restringe à Educação. É muito mais abrangente.
As raízes da “árvore frondosa” de PF a qual FB fez referência se espraiou para além dos seus “círculos de cultura”, fazendo água em vários setores essenciais de nossa sociedade. Comemorar o Centenário de nascimento de Paulo Freire significa reverenciar não apenas o Educador, o Patrono da Educação brasileira, mas também um ser humano engajado nos moldes em que o sociólogo brasileiro e tributário de PF, Florestan Fernandes, sempre defendeu, ou seja, um intelectual não deve se desprender de sua ideologia, de de sua luta política. Como o próprio PF argumentava: “Não há educação neutra”. (*) Dora Stephan – jornalista e professora da UEMG/ Unidade Leopoldina.