25/03/2022 às 09h52min - Atualizada em 25/03/2022 às 09h52min

O CASO TELEGRAM: INTERINCOMPREENSÃO (DES)REGRADA?

Crítico do papel das novas tecnologias no processo de disseminação de informação, o escritor e filólogo italiano Umberto Eco afirmou que as redes sociais dão o direito à palavra a uma "legião de imbecis" que antes falavam apenas "em um bar e depois de uma taça de vinho, sem prejudicar a coletividade".
 
Queridos leitores, o mote deste artigo articula-se com a transcendência do tema, já que em voga está a suspensão do aplicativo Telegram no Brasil por decisão do Supremo Tribunal Federal, em decorrência do ‘Contempt of  Court’ (Ato Atentatório à Dignidade da Justiça) e o grave risco de  uso da aludida tecnologia para disseminação de desinformação (‘Fake News’).

Para introduzir o assunto é preciso contextualizar o advento da rede mundial de computadores na década de 90 e seu processo gradativo de descredenciamento das especialidades (expertise profissional). De modo geral, o cotidiano do senso comum passou a reproduzir um autodidatismo generalista, desprovido de base teórica, extremamente nocivo ao salutar desenvolvimento da vida gregária, uma vez que, paradoxalmente, a facilidade libertária em acessar conteúdos dos mais diversos culminou por, naturalmente,  fomentar um individualismo autoritário e presunçoso em relação ao papel e importância de cada indivíduo na vida em sociedade.

“De médico e louco todo mundo tem um pouco!” Quem nunca ouviu? Hoje com o “Google”, aquele leitor de, no máximo 10 linhas, que o Jurista Lênio Streck vem denunciando (leiam a coluna Senso Incomum no portal CONJUR) assume um protagonismo mitômano em um cabedal de assuntos diminuindo, em derradeiro, o valor de quem, realmente, se preparou para formar determinada opinião. Isso se dá em todas as searas: medicina; advocacia; engenharia; educação, dentre outras, mas, especialmente, no jornalismo.

É nesse ambiente paralelo de clara distropia que o Telegram encontrou seu nicho perfeito. As “notícias” são (re)compartilhadas em grupos numerosos sem qualquer controle editorial, análise do discurso, pensamento crítico ou mesmo checagem sobre a veracidade. Aquele(a) que mal leu já repassou a postagem... É o ‘mundo líquido’ de Zygmunt Bauman!

Para enfrentar tempos tão sombrios na democracia brasileira e toda aflição que o inequívoco desmonte institucional vem provocando desde o Golpe de 2016 confesso que, no intuito de me distinguir da conspiração de néscios, preferi me valer uma característica do período literário neoclássico, utilizando o “Escapismo” diante do incontrolável estarrecimento com tanta alienação nas redes sociais. 

Um alento a tudo isso está na existência de muitos ambientes virtuais (‘Pasárgada Intelectual’) que foram capazes de emanar conhecimento, positividade e felicidade, nos permitindo vivenciar um mundo, ainda que idealizado, onde haja a livre confluência de perspectivas, com respeito à pluralidade e diversidade, impactando na melhoria dos padrões de qualidade de vida da coletividade. Neste sentido, recomendo a integração em ambientes digitais como o Canal do Conde no Youtube (Gustavo Conde – Linguista | “Desinfluenciador Digital”), notadamente, a temporada do programa  “Desentrevista” com Rogério Skylab, onde cumprem, de forma altruística, um papel pedagógico – com didática contemporânea e linguagem simples sem esquecer da base teórica – sobre temas relevantes e urgentes que padecem de boa reflexão.

Posta assim a questão, não obstante toda a necessidade de aprofundamento desta discussão e sua aplicação nas regras eleitorais, este tema está para além da justificativa de qualquer ideologia, porquanto se acumulam evidências de um problemático contexto político, cultural, social e religioso etc, se desenvolvendo no espaço digital, de forma desregrada, dentre muitas questões, o crescimento expressivo das interações hostis e agressivas em discussões online, marcadas pela linguagem insultuosa à qualquer ideia de oposição.

Em remate, o objetivo deste texto foi descortinar a conjuntura de manipulação da informação na abordagem das polêmicas traduzidas em discursos binários que se constroem opondo-se um ao outro, sem que haja a possibilidade de consenso, mas, sobretudo, promover a Educação Digital no seu sentido mais amplo.

(*)  Edmundo Gouvêa Freitas é Mestre em Hermenêutica e Direitos Fundamentais, Professor Externo da UNEMAT – Universidade Estadual do Mato Grosso, Advogado Sênior e Consultor Jurídico.
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