O que sempre intrigou as pessoas no MUNDO DO SAMBA foi : por que o codinome CAVAQUINHO , embora mestre no pequeno instrumento , se o compositor se apresentava , quase sempre , com VIOLÃO ? Assim também , com o codinome de VIOLA , PAULINHO , que , em suas aparições , porta um CAVAQUINHO . A verdade maravilhosa nessa permuta é que os dois instrumentos de corda e os dois compositores , em uma simbiose musical maravilhosa , ornamentam o RITMO , a HARMONIA e a MELODIA , demonstrando , em suas apresentações , a sonoridade divina do SAMBA .
Hoje o espaço deste artigo está reservado para um simples desfile em VERDE e ROSA nas composições de NÉLSON CAVAQUINHO , autor que contribuiu com suas PÉTALAS musicais juntamente com poetas como : CARTOLA , GUILHERME DE BRITO , CARLOS CACHAÇA , NELSON SARGENTO , GERALDO PEREIRA e outros bambas , para embelezamento da ROSA plantada no VERDE jardim harmonioso e melódico da Estação Primeira de Mangueira .
Nélson Antônio da Silva , mais conhecido como NÉLSON CAVAQUINHO , cujo pai era contramestre da Banda da Polícia Militar, nasceu no bairro da Tijuca , Rio de Janeiro , no dia 29 de outubro de 1911. Sendo de uma família de músicos , participava , com seu cavaquinho , aos domingos , das rodas de samba em sua casa , organizada pelo pai . Depois de muitas mudanças de endereço da família , foi fixar sua morada no Morro de Mangueira , onde conheceu outros compositores da Escola , somando com eles o verdadeiro tesouro musical que é um destaque de beleza na MÚSICA POPULAR BRASILEIRA.
Iniciaremos o desfile de suas pérolas musicais com a mais preciosa obra de seu cancioneiro : “ A FLOR E O ESPINHO “ , composição criada junto com Guilherme de Brito e Alcides Caminha . A canção versa sobre uma desilusão amorosa devido à incompatibilidade de sentimentos , representada , metaforicamente , pela FLOR e pelo ESPINHO. [ “ / Tire o seu sorriso do caminho / Que eu quero passar com a minha dor / Hoje pra você eu sou espinho / Espinho não machuca flor / Eu só errei porque juntei minh’alma a sua / O sol não pode viver perto da lua / É no espelho que eu vejo a minha mágoa / E a minha dor e os meus olhos rasos d’água / Eu na sua vida já fui uma flor / Hoje sou espinho em seu amor / “ ] . Ainda em parceria com Guilherme de Brito , compuseram , apaixonadamente , uma imensa declaração de amor pela Mangueira , escola de seus corações : “ FOLHAS SECAS “ [ / “Quando eu piso em folhas secas / Caídas de uma mangueira / Penso na minha escola / E nos poetas da minha estação primeira / Não sei quantas vezes / Subi o morro cantando / Mesmo com o sol me queimando / E assim vou me acabando /“ ] . Não poderíamos deixar de apresentar a composição que leva no tema uma verdadeira mensagem : “ reconhecimento e valor nos sucessos das pessoas enquanto vivas “ . Ainda com o grande parceiro Guilherme de Brito, compuseram : “ QUANDO EU ME CHAMAR SAUDADE “ . [ “ / Sei que amanhã / Quando eu morrer / Os meus amigos vão dizer / Que eu tinha bom coração / Alguns até hão de chorar / E querendo me homenagear / Fazendo de ouro um violão / Mas depois que o tempo passar / Sei que ninguém vai se lembrar / Que eu fui embora / Por isso é que eu penso assim / Se alguém quiser fazer por mim / Que faça agora. / Me dê as flores em vida / O carinho / A mão amiga / Para aliviar meus ais / Depois que eu me chamar saudade / Não preciso de vaidade / Quero preces e nada mais / “ ] . “ PALHAÇO “, em parceria com Oswaldo Martins e Washington Fernandes , foi a composição motivadora para o aprofundamento da polêmica musical sobre o relacionamento entre Herivelto Martins e Dalva de Oliveira em uma simples alusão a ele que , em início de sua carreira , fora palhaço de circo. Dalva deu um molho irônico e especial na interpretação da letra na canção . [ “ / Sei que é doloroso um palhaço / Se afastar do palco por alguém / Volta, que a platéia te declama / Por que choras , palhaço / Por alguém que não te ama ./ Enxuga os teus olhos e me dá um abraço / Não te esqueças que és um palhaço / Faz a plateia gargalhar / Um palhaço não deve chorar / “ ] . A preocupação de Nélson em extirpar do mundo a MALDADE e fazer retornar aos corações das pessoas o AMOR , está evidenciada em “ JUÍZO FINAL “ , criação em parceria com Elcio Soares . [ “ / O sol ... há de brilhar mais uma vez / A luz ... há de chegar aos corações / Do mal será queimada a semente / E o amor... será eterno novamente . / É o juízo final , a história do bem e do mal / Quero ter olhos pra ver , a maldade desaparecer / “ ] . Embora não deixando transparecer , Nélson sempre se preocupou com a fugacidade do tempo , porque a velhice o apavorava . Junto com Augusto Garcez e Ary Monteiro compuseram “ RUGAS “ . [ “ / Se eu for pensar muito na vida / Morro cedo , amor / Meu peito é forte / Nele tenho acumulado tanta dor / . As rugas fizeram residência no meu rosto / Não choro pra ninguém / Me ver sofrer de desgosto /. Eu que sempre soube / Esconder a minha mágoa/ Nunca ninguém me viu / Com os olhos rasos d’água / Finjo-me alegre / Pro meu pranto ninguém ver / Feliz daquele que sabe sofrer / . “ ] . Ainda reconhecendo a realidade da perda de uma mocidade maravilhosa e com a aproximação da velhice , o que muito o entristece , deixa transparecer uma tristeza na canção : “ DEGRAU DA VIDA “ . [ “ / Sei que estou / No último degrau da vida , meu amor , / Já estou envelhecido , acabado / Por isso muito eu tenho chorado / Eu não posso / Esquecer o meu passado / Foram-se os meus vinte anos de idade / Já vai muito longe/ A minha mocidade / Sinto uma lágrima rolar sobre meu rosto / É tão grande o meu desgosto / “ ] . Nelson e Amâncio Cardoso criaram , em linhas melódicas , um verdadeiro retrato de quem sofre de solidão na canção : “ LUZ NEGRA “. [ “ / Sempre só / Eu vivo procurando alguém / Que sofre como eu também / E não consigo achar ninguém / . Sempre só / E a vida vai seguindo assim / Não tenho quem tem dó de mim / Estou chegando ao fim / . A luz negra de um destino cruel / Ilumina um teatro sem cor / Onde estou desempenhando um papel / De palhaço do amor / “ ] . Nelson não se esqueceu de exaltar o valor dos poetas de sua Escola de Samba , demonstrando , em suas linhas musicais , uma possível perda de um dos compositores da Mangueira e o profundo sentimento de todos componentes da Agremiação . Mais uma vez com seu parceiro Guilherme de Brito criaram a relíquia : “ PRANTO DO POETA “. [ “ / Em Mangueira / Quando morre um poeta / Todos choram / Vivo tranquilo em Mangueira , porque / Sei que alguém há de chorar quando eu morrer /. Mas o pranto de Mangueira é tão diferente / É um pranto sem lenço / Que alegra a gente / Hei de ter um alguém / Pra chorar por mim / Através de um pandeiro e de um tamborim / . “ ] . Sobre o tema traição , Nélson , muito motivado , compõe uma canção, criando uma sequência cênica fictícia , no momento do encontro com um amigo que o traíra e comunicava o ato da separação através da NOTÍCIA . [ “ / Já sei a notícia que vens me trazer / Os teus olhos só faltam dizer / O melhor é eu me convencer / Guardei até onde eu pude guardar / O cigarro deixado em meu quarto / É a marca que fumas confessa a verdade / Não deves negar / Amigo como eu jamais encontrarás / Só desejo que vivas em paz / Com aquela / Que manchou meu nome / Vingança , meu amigo , eu não quero vingança / Os meus cabelos brancos / Me obrigam a perdoar uma criança / “ ] . O período de carnaval sempre foi caracterizado como um momento temporário de separação entre os casais , para curtirem o “ Reinado de Momo “ , com retorno ao lar na quarta-feira de cinzas. Diante de sua bela inspiração , Nélson criou “ VOU PARTIR “ [ “ / Vou partir não sei se voltarei .../ Tu não me queiras mal / Hoje é carnaval . / Partirei para bem longe / Não precisas te preocupar / Só voltarei pra casa / Quando o carnaval acabar .... / “ ] .
Para encerrar esta pequena amostra da galeria musical de NÉLSON CAVAQUINHO e outros compositores , selecionamos a canção “ MINHA ALEGRIA “ , em parceria com Guilherme de Brito , como compensação a todas as decepções e sofrimentos amorosos desfilados nos temas poéticos do autor . [ “ / Graças a Deus , minha vida mudou , / Quem me viu , quem me vê / A tristeza acabou . / Contigo aprendi a sorrir / Escondeste o pranto de quem sofreu tanto / Organizaste uma festa em mim / É por isso que eu canto assim / lalaraia laralaia/................//// “ ] .
O imenso repertório de NELSON CAVAQUINHO não nos permitiu desfilar outras maravilhosas canções , devido à limitação espacial do nosso artigo , entretanto fizemos uma seleção cuidadosa das músicas mais populares , para que nossos leitores identificassem , em cada canção , as linhas melódicas e as mensagens poéticas em suas letras , entoando seus cantos e melodias de cada música .
A grande satisfação dos AMANTES DA BOA MÚSICA é saber que parte da felicidade está implícita nas linhas poéticas preservadas nas composições da MÚSICA POPULAR BRASILEIRA .
WALDEMAR PEDRO ANTONIO E-MAIL [email protected]