Este espaço do CANTINHO MUSICAL está reservado agora para um desfile da várias composições resultantes da criação destes dois gênios da MÚSICA POPULAR BRASILEIRA: JOÃO BOSCO E ALDIR BLANC . O encaixe esplendoroso da alma musical da dupla desperta harmonicamente na consciência das pessoas amantes das boas canções , elegendo-os como compositores de respeito e admiração no cenário da nossa MPB . JOÃO BOSCO , mineiro de Ponte Nova , cantor , músico e compositor , dedicava-se sobremaneira à carreira musical , influenciado principalmente por gêneros como jazz , bossa nova e pelo tropicalismo. Em 1970 , conheceu um brilhante poeta , natural do Estácio , no Rio de Janeiro , que viria a ser o mais freqüente parceiro , com quem compôs lindas canções de grande sucesso : ALDIR BLANC . Com ele formou a mais expressiva dupla de compositores , contribuindo com suas criações para enriquecimento musical de nosso cancioneiro . A dupla deslanchou nas grandes paradas de sucesso , quando a voz maravilhosa e cristalina de ELIS REGINA soou , nos ouvidos dos que apreciam a boa música , o bolero : “ DOIS PRA LÁ , DOIS PRA CÁ “ . [ “ / Sentindo frio em minh’alma / te convidei pra dançar / A tua voz me acalmava / É dois pra lá , dois pra cá / Meu coração traiçoeiro / Batia mais que um bongô / Tremia mais que as maracás / Descompassado de amor / Minha cabeça rodando / Rodava mais que os casais / O teu perfume gardênia / E não me pergunte mais / A tua mão no pescoço / As tuas costas macias /Por quanto tempo rondaram / As minhas noites vazias / No dedo um falso brilhante / Brincos iguais ao colar / E a ponta de um torturante / Band-aid no calcanhar / E hoje me embriagando / De whisky com guaraná / Ouvi tua voz sussurando / São dois pra lá , dois pra cá / . “ ] .
Há , em seus repertórios , uma linda canção que , a despeito dos acontecimentos históricos , a dupla compôs , usando e abusando de uma linguagem metafórica , uma narrativa fictícia que faz uma alusão a todo sofrimento dos africanos que eram escravizados nas águas da Guanabara , resgatando , simbolicamente , a história do marinheiro João Cândido , “ Almirante Negro “ , líder da revolta das chibatas , ocorrida em 1910 , rotulando-o como “ MESTRE-SALA DOS MARES “ . [ “ / Há muito tempo / Nas água da Guanabara / Um dragão do mar reapareceu , / Na figura de um bravo feiticeiro / A quem a história não escreveu . / Conhecido como Navegante negro , / Tinha a dignidade de um mestre-sal a / E ao acenar pelo mar , na alegria das regatas / Foi saudado no porto / Pelas mocinhas francesas / Pelas polacas e um batalhão de mulatas . / Rubras cascatas / Jorravam das costas dos santos / Entre cantos e chibatas / Inundando o coração / Do pessoal de porão / Que , a exemplo do feiticeiro / Gritava então : / Glória aos piratas , / Às mulatas , / Às sereias , / Glória à farofa , / À cachaça / À baleia ... / Glória a todas as lutas inglórias / Que através da nossa história / Não esquecemos jamais . / Salve , o navegante negro , / Que tem por monumento / As pedras pisadas no cais / . “ ] .
Há uma bela canção , identificada na voz de ELIS REGINA , intérprete preferida da dupla , composta inicialmente para homenagear Chaplin , mudando seu rumo temático , num encontro casual com Henfil e Chico Mário em que comentaram o exílio do irmão Betinho , logo modificando para uma mensagem de resistência ao período repressivo por que passava o Brasil . Velada em uma crítica ao sistema ditatorial , a dupla relata uma situação política pela qual passava o povo brasileiro , com seus filhos exilados , tudo expresso em uma canção , considerada o hino da anistia : “ O BÊBADO E A EQUILIBRISTA “ . [ “ / Caía a tarde feito um viaduto / Um bêbado trajando luto me lembrou Carlitos / A lua , tal qual a dama de um bordel , / Pedia a cada estrela fria / Um brilho de aluguel / E nuvens , lá no mata-borrão do céu / Chupavam manchas torturadas , que sufoco / Louco , o bêbado com chapéu –coco / Fazia irreverência pra noite do Brasil / Meu Brasil / Que sonha com a volta do irmão do Henfil / Com tanta gente que partiu num rabo de foguete / Chora a nossa pátria , mãe gentil / Choram Marias e Clarices no solo do Brasil / Mas sei que uma dor assim pungente / Não há de ser inutilmente , a esperança / Dança na corda bamba de sombrinha / E em cada passo dessa linha , pode se machucar / Azar, a esperança equilibrista / Sabe que o show de todo artista / Tem que continuar ... / . “ ] .
A sintonia no comportamento de um casal nem sempre é harmoniosa quando ideias diversas criam choques no entendimento . Nesta canção , a dupla cria um mal-estar entre o casal , retratando a insatisfação da mulher em tudo que o companheiro faz , reclamando , sistematicamente , dos atos por ele praticados , o que configura uma verdadeira “ INCOMPATIBILIDADE DE GÊNIOS “ . [ “ / Dotô , / Jogava o Flamengo , eu queria escutar / Chegou / Mudou de estação , começou a cantar / Tem mais / Um cisco no olho , ela em vez de assoprar / Sem dó / Falou que por ela eu podia cegar / Se eu dou / Um pulo , um pulinho , um instantinho no bar / Bastou / Durante dez noites me faz jejuar / Levou / As minhas cuecas prum bruxo rezar / Coou / Meu café na calça pra me segurar / Se eu tô , ai , se eu tô / Devendo dinheiro e vem me cobrar / E vem me cobra / Dotô / Ai , dotô / A peste abra a porta e ainda manda sentar / Ainda manda “ sentá “ / Depois / Se eu mudo de emprego que é pra melhorar / Que é só pra melhorar / Vê só / Convida a mãe dela pra ir morar lá / Se eu peço feijão , ela deixa salgar / Calor / Ai , calor / Mas veste o casaco pra me atazanar / E ontem / Sonhando comigo , mandou eu jogar / Mandou eu “ jogá “ / No burro / Foi no burro / E deu na cabeça a centena e o milhar / Ai , quero me separar ! / . “ ] .
O espírito de brasilidade sempre foi um compromisso nas mensagens musicais de JOÃO e ALDIR . Nesta canção , que deu nome a um de seus álbuns , desfolham-se várias citações sobre os hábitos , a culinária e o folclore brasileiros , incorporados na melodia de um samba , com um ritmo acelerado de uma “ LINHA DE PASSE “. [ “ / Toca de tatu, lingüiça e paio e boi zebu / Rabada com angu, rabo-de-saia / Naco de peru, lombo de porco com tutu / E bolo de fubá , barriga d'água / Há um diz que tem e no balaio tem também / Um som bordão bordando o som, dedão, violação / Diz um diz que viu e no balaio viu também / Um pega lá no toma-lá-dá-cá, do samba / Um caldo de feijão, um vatapá, e coração / Boca de siri, um namorado e um mexilhão / Água de benzê, linha de passe e chimarrão / Babaluaê, rabo de arraia e confusão... / Eh, yeah, yeah . . . / (Valeu, valeu, Dirceu do seu gado deu...)/ Cana e cafuné, fandango e cassulê / Sereno e pé no chão, bala, camdomblé / E o meu café, cadê? Não tem, vai pão com pão / Já era Tirolesa, o Garrincha, a Galeria / A Mayrink Veiga, o Vai-da-Valsa, e hoje em dia / Rola a bola, é sola, esfola, cola, é pau a pau / E lá vem Portela que nem Marquês de Pombal / Mal, isso assim vai mal, mas viva o carnaval / Lights e sarongs, bondes, louras, King-Kongs / Meu pirão primeiro é muita marmelada / Puxa saco, cata-resto, pato, jogo-de-cabresto / E a pedalada / Quebra outro nariz, na cara do juiz / Aí, e há quem faça uma cachorrada / E fique na banheira, ou jogue pra torcida / Feliz da vida / ( REPETIÇÃO DA 1ª. ESTROFE ) / . “ ] .
Prazerosa é a tranquilidade que se evidencia no colo da mulher amada . E é ainda mais prazerosa quando o ambiente é ornamentado pelos cenários de fenômenos naturais , juntando-se com uma bela coloração da cena . Estes ingredientes estão presentes nesta bela canção como brinquedos de “ PAPEL MACHÊ “ . [ “ / Cores do mar, festa do sol / Vida é fazer / Todo o sonho brilhar / Ser feliz / No teu colo dormir / E depois acordar /Sendo o seu colorido / Brinquedo de Papel Machê...(2x) / Dormir no teu colo / É tornar a nascer / Violeta e azul / Outro ser / Luz do querer... / Não vai desbotar / Lilás cor do mar / Seda cor de batom / Arco-íris crepom / Nada vai desbotar / Brinquedo de Papel Machê... / Dormir no teu colo / É tornar a nascer / Violeta e azul / Outro ser / Luz do querer... / Não vai desbotar / Lilás cor do mar / Seda cor de batom / Arco-íris crepom / Nada vai desbotar / Brinquedo de Papel Machê... / Ai Ai Ai Ai Ai Ai!! / Lê Lê Lê Lê Lê Lê Lê / Lon Lon Lon Lon Ah! / Lê Lê Lê Lê Lê Lê Lê / Lon Lon Lon Lon Ah!... / . “ ] .
JOÃO BOSCO e ALDIR BLANC observaram , depois de uma longa parceria com muita consistência , que , junto ao prazer de compor , de cantar e tocar músicas , havia também vários motivos de indignação , diante de um quadro político da época . Com isso , compuseram maravilhosas canções , expressando uma resistência através da música e usando uma linguagem manifestada por meio de construções metafóricas , o que se apresenta em “ KID CAVAQUINHO “ . [ “ / Oi que foi só pegar no cavaquinho / Pra nego bater / Mas seu contar o que é que pode um cavaquinho / Os home não vão crer: / Quando ele fere, fere firme / E dói que nem punhal / Quando ele invoca até parece / Um pega na geral / Genésio! / A mulher do vizinho / Sustenta aquele vagabundo / Veneno é com meu cavaquinho / Pois se eu tô com ele / Encaro todo mundo / Se alguém pisa no meu calo / Puxo o cavaquinho / Pra cantar de galo / . “ ] .
Inconformados com a triste situação que envolve o ser humano , motivada por estados de fome e raiva , JOÃO e ALDIR compuseram como grito de alerta uma canção para despertar nas pessoas o inconformismo do homem diante de um quadro deprimente , utilizando simplesmente o “ RONCO DA CUÍCA “ . [ “ / Roncou, roncou / Roncou de raiva a cuíca / Roncou de fome / Alguém mandou / Mandou parar a cuíca, é coisa dos home / A raiva dá pra parar, pra interromper / A fome não dá pra interromper / A raiva e a fome é coisas dos home / A fome tem que ter raiva pra interromper / A raiva é a fome de interromper / A fome e a raiva é coisas dos home / É coisa dos home / É coisa dos home / A raiva e a fome / A raiva e a fome /Mexendo a cuíca / Vai tem que roncar /. “] .
Amparados por um plano fictício , criado na memória da dupla , JOÃO e ALDIR descrevem uma cena deprimente , onde ocorre a desgraça de uma pessoa do nosso cotidiano , momento em que oportunistas tiram partido da situação para se dar bem , quando estão “ DE FRENTE PRO CRIME “. [ “ / Tá lá o corpo / Estendido no chão / Em vez de rosto uma foto / De um gol / Em vez de reza / Uma praga de alguém / E um silêncio / Servindo de amém... / O bar mais perto / Depressa lotou / Malandro junto / Com trabalhador / Um homem subiu / Na mesa do bar / E fez discurso / Pra vereador... / Veio o camelô / Vender! / Anel, cordão / Perfume barato / Baiana / Prá fazer / Pastel / E um bom churrasco / De gato / Quatro horas da manhã / Baixou o santo / Na porta bandeira / E a moçada resolveu / Parar, e então... / Tá lá o corpo / Estendido no chão / Em vez de rosto uma foto / De um gol / Em vez de reza / Uma praga de alguém / E um silêncio / Servindo de amém... / Sem pressa foi cada um / Pro seu lado / Pensando numa mulher / Ou no time / Olhei o corpo no chão / E fechei / Minha janela / De frente pro crime... / Veio o camelô / Vender! / Anel, cordão / Perfume barato / Baiana / Prá fazer / Pastel / E um bom churrasco / De gato / Quatro horas da manhã / Baixou o santo / Na porta bandeira / E a moçada resolveu / Parar, e então...(2x) / Tá lá o corpo / Estendido no chão... / . “ ] .
Nesta canção , que foi abertura de novela , há uma configuração da imagem do autor , descrevendo à sua amada suas preferência de vida , porém muito preocupado com a fugacidade do tempo , demonstrando uma falsa visão como uma “ BIJOUTERIA “ . [ “ / Em setembro / Se Vênus me ajudar / Virá alguém / Eu sou de virgem / E só de imaginar / Me dá vertigem / Minha pedra é ametista / Minha cor, o amarelo / Mas sou sincero / Necessito ir urgente ao dentista / Tenho alma de artista / E tremores nas mãos / Ao meu bem mostrarei / No coração. Um sopro e uma ilusão / Eu sei / Na idade em que estou / Aparecem os tiques, as manias / Transparentes Transparentes / Feito bijuterias / Pelas vitrines / Da Sloper da alma / . “ ] . O CANTINHO MUSICAL encerra as amostras musicais desses dois exponenciais de nossas canções , lamentando não ter espaço suficiente para manifestação das imensas criações maravilhosas que compõem o cancioneiro de JOÃO BOSCO e ALDIR BLANC .
“ HÁ UMA BELA FILOSOFIA SOBRE O AMOR QUANDO SE FALA DAS METADES QUE SE SEPARARAM E SE PERDERAM PELO MUNDO , BUSCANDO ELAS , INCESSANTEMENTE , SUAS PARTES PARA SE CONSTITUÍREM UM INTEIRO . TENHO A PLENA CONVICÇÃO DE QUE JOÃO BOSCO E ALDIR BLANC ENCONTRARAM AS DEVIDA PARTES EM SUAS ALMAS MUSICAIS E FORMARAM UM VERDADEIRO TODO . “