Com a alma coberta de orgulho , O CANTINHO POÉTICO homenageará , nesta semana , para contentamento do povo leopoldinense , os poemas deste que , ao cabo de sua vida breve , iluminou o nome de Leopoldina no cenário poético brasileiro : AUGUSTO DOS ANJOS .
No engenho do Pau-d’Arco , perto da vila do Espírito Santo , Estado da Paraíba , nascia no dia 20 de abril de 1884 , AUGUSTO CARVALHO RODRIGUES DOS ANJOS . No ano de 1990 , com 15 anos de idade , já vivia uma vida consciente de adulto , demonstrando uma enorme intelectualidade poética , até sua morte em 1914 , coexistindo no Brasil , com escritores integrados nos mais diferentes movimentos literários , sendo classificado , durante certo período , como simbolista, associando-se ao nome de Cruz e Sousa. Em conseqüência dos usos simbólicos feitos pelo Poeta do material não raro de proveniência científica, para fins de enlace estético e emocional, construiu uma poesia esotérica. Augusto dos Anjos foi incluído numa modalidade de poetas chamados cientificista e filosofante : como filosofante se reflete , mais que tudo , na aventura do seu espírito à cata de uma definição para si mesmo , para a sua visão dos outro , para sua visão do mundo e para sua inserção dentro da natureza. Tendo a publicação em primeira edição de seu livro de poesia “ EU ”, em 1912 , somente a partir da 3ª. edição , em 1928 , que começou a penetrar nos meios do leitor comum . Daí em diante vem mantendo-se o interesse que desperta a curiosidade pelo seu preciosismo vocabular, certas imagens fantásticas, quase surrealista , certas tiradas pessimistas e uma aparente imaturidade inconformista .
Passamos, a partir de agora, ao pequeno desfile das obras dessa intelectualidade poética que abrilhantou o cenário de nossa galeria literária .
O fato de ser ostensivamente um ateu , pelo menos em suas poesia , não exclui de Augusto dos Anjos uma dolorosa visão solitária com os seres e as coisas , embora lhe permita na direção desesperada de crer que o mal presida à vida e que esta é , sobretudo , um caminho para a morte . No soneto SOLITÁRIO ao lado , demonstra poeticamente os caracteres do que foi esboçado sobre sua própria solidão e a visão mórbida do tema .
Em “ VERSOS ÍNTIMOS “ , Augusto dos Anjos expressa uma visão da realidade humana em maravilhosa composição poética .Diante de tal constatação , demonstra o Poeta grande depressão causada pela descrença sobre a honestidade do ser humano , fazendo um alerta para despertar em relação ao comportamento das pessoas .
Em “ Natureza Íntima “ , poema dedicado ao filósofo Faria Brito , Augusto dos Anjos encara a natureza humana sobre dois aspectos : a face externa do homem diante do reflexo do mundo ; e a face introspectiva que julga todo comportamento diante da vida, concluindo o total desconhecendo a sua própria existência .
Augusto dos Anjos , em “ O Morcego "Toma como símbolo medonho um animal que é constante personagem das noites . O motivo deste soneto teve como ponto de referência um dos temas que ocorre nas linhas de outro poema dele “ Monólogo de Uma Sombra “ sob a denominação de remorsos , enquanto nesta poesia é a consciência humana o centro temático .
Há em três sonetos uma verdadeira sequência de fatos que marcaram , na memória do Poeta , uma profunda tristeza , porém expressos em uma visão da realidade diante da morte do pai . O primeiro manifesta um lamento sobre a doença já prevendo o passamento do pai ; o segundo é um canto
fúnebre e sofredor causado pela morte paterna ; o terceiro exterioriza toda uma expressão materialista sobre a decomposição da matéria do pai, ilusoriamente descrito em versos chocantes que nos dão a realidade dos aspectos da morte .
SONETO I ( A meu pai doente ) | | SONETO II ( A meu Pai morto ) | | |
Para onde fores , Pai , para onde fores , Irei também , trilhando as mesmas ruas ... Tu , para amenizar as dores tuas , Eu , para amenizar as minhas dores ! Que coisa triste ! O campo tão sem flores , E eu tão sem crença e as árvores tão nuas E tu , gemendo , e o horror de nossas duas Mágoas crescendo e fazendo horrores ! Magoaram-te , meu Pai ?! Que mão sombria , Indiferente aos mil tormentos teus De assim magoar-te sem pensar havia ?! De assim magoar-te sem pensar havia ?! É bom , é justo , e sendo justo , Deus , Deus não havia de magoar-te assim ! | | Madrugada de treze de Janeiro, Rezo , sonhando , o ofício da agonia . Meu Pai nessa hora junto a mim morria Sem um gemido , assim como um cordeiro ! E eu nem lhe ouvi o alento derradeiro ! Quando acordei , cuidei que ele dormia E disse à minha Mãe que me dizia : “ Acorda-o “ ! Deixa-o , Mãe , dormir primeiro ! E saí para ver a Natureza ! Em tudo o mesmo abismo de beleza , Nem uma névoa no estrelado véu ... Mas pareceu-me , entre as estrelas flóreas , Como Elias , num carro azul de glória , Ver a alma de meu Pai subindo ao céu ! | | |
SONETO III ( A decomposição do corpo do Pai ) Podre meu Pai ! A morte o olhar lhe vidra .
Em seus lábios que os meu lábios osculam
Micro-organismos fúnebres pupulam
Numa fermentação gorda de cidra .
Dura leis as que os homens e a hórrida hidra
A uma só lei biológica vinculam ,
E a marcha das moléculas regulam ,
Com a invariabilidade da clepsidra !...
Podre meu Pai ! E a mão que enchi de beijos
Roídas toda de bichos , como os queijos
Sobre a mesa de orgíacos festins !...
Amo meu Pai na atômica desordem
Entre as bocas necrófagas que o mordem
E a terra infecta que lhe cobre os rins !
O poema “ Vandalismo “ retrata , em uma profunda linguagem metafórica , o coração e a paixão que representam “ o querer “ do Poeta , descrito através de um Templo grandioso e sublime . O conflito entre o amor idealizado e o arrebatamento expresso da realidade está contido na imagem poética do “Templário “ e em seu poder confessional .
A pedido de
TAYNARA MORAIS , uma ardorosa fã das poesias de Augusto dos Anjos , incluí no artigo Este belo poema . Augusto dos Anjos , além de dispensar um vocabulário científico neste poema , dá-nos um retrato corpóreo como receita para o bem-estar diante da vida . O valor e a beleza deste soneto estão nas maravilhosas expressões líricas e nas definições poéticas entre Deus e o Amor . O Bem situa-se, justamente , na crença deste mistério sacrossanto que conduz , com muita fé e esperança , à receita do amor bendito .
O CANTINHO POÉTICO apresentou uma pequena amostra da vasta produção artística de AUGUSTO DOS ANJOS . Autor que criava suas obras manuseando palavras e expressões , com excessivo rebuscamento , emergidas dos subterrâneos da alma , com temas mórbidos , científicos e , principalmente , didáticos sobre a natureza humana . O grande orgulho do povo leopoldinense encontra-se na certeza de que Leopoldina foi cenário para atuação deste Poeta ao cabo de sua breve vida e de que guarda em um relicário os restos mortais de AUGUSTO DOS ANJOS .