15/04/2016 às 17h06min - Atualizada em 15/04/2016 às 17h06min

Semana dos poemas de Raimundo Correia

RAIMUNDO  CORREIA  (Raimundo da Mota de Azevedo Correia), magistrado, professor, diplomata e poeta, nasceu em 13 de maio de 1859, a bordo do navio brasileiro São Luís, ancorado na Baía de Mogúncia, MA, e faleceu em Paris, França, em 13 de setembro de 1911.  Estreou  na  literatura em 1879, com o volume de poesias Primeiros sonhos , revelando  forte influência dos poetas  românticos . Algumas  características do Poeta  estão estampadas em seus poemas como : obediência formal , cultura clássica , exaltação à natureza ,visão negativa do mundo , pessimismo com tom filosófico e desilusão diante da vida . Apesar de ser caracterizado como poeta  parnasiano , boa parte de seus poemas expressa características da poesia simbolista , o que alimenta a posição de alguns críticos literários . Faremos , a partir de agora , uma pequena apresentação dos poema de RAIMUNDO CORREIA , fruto de uma triagem em sua vasta galeria poética . Iniciaremos com um dos mais conhecidos sonetos da língua portuguesa , ‘ AS  POMBAS  “ , poema que lhe valeu o epíteto de  “O  Poeta  das  Pombas" , que ele tanto rejeitou durante a vida .
                    
Dentro de uma perfeição formal, traço obrigatório no estilo parnasiano, o poema  “AS  POMBAS"  exalta, como foco principal , a natureza, descrevendo a revoada das aves em um movimento de ida  e  volta e comparando, maravilhosamente, em uma expressão metafórica , com  os sonhos da adolescência .  
 
AS  POMBAS
 
“Vai-se a primeira pomba  despertada …
Vai-se outra mais … mais outra … enfim dezenas
De pombas vão-se dos pombais, apenas
Raia sanguínea e fresca a madrugada …


E à tarde, quando a rígida nortada
Sopra, aos pombais de novo elas, serenas,
Ruflando as asas, sacudindo as penas,
Voltam todas em bando e em revoada…
 

Também dos corações onde abotoam,
Os sonhos, um por um, céleres voam,
Como voam as pombas dos pombais;


No azul da adolescência as asas soltam,
Fogem… Mas aos pombais as pombas voltam,
E  eles aos corações não voltam mais…”

 
O  soneto  é  um retrato comportamental do  ser humano , utilizando máscaras  que acabam ocultando aqueles que seriam seus sentimentos verdadeiros  .  A visão mascarada da sociedade  é a camuflagem  da real situação dos fatos , tornando-se falso o gesto expresso em suas faces .
 
MAL SECRETO

Se a cólera que espuma, a dor que mora
 N’aIma, e destrói  cada ilusão que nasce,
 Tudo o que  punge, tudo o que devora
 O coração, no rosto se estampasse;

Se  se  pudesse, o espírito que chora,
Ver  através  da mascara da  face,
Quanta  gente, talvez, que  inveja  agora
 Nos causa, então piedade nos causasse!
 
Quanta gente que ri, talvez , consigo
 Guarda  um atroz, recôndito   inimigo,
 Como  invisível  chaga  cancerosa!

Quanta gente que ri, talvez  existe,
Cuja  ventura  única  consiste
Em  parecer  aos  outros   venturosa  . 

 
No soneto abaixo , o Poeta pinta um cenário do trânsito de um grupo
de fidalgo que volta da caçada .  Em  uma visão metafórica , poderíamos associar  “ a  cavalgada “ , tratada no texto não como um simples galopar  , mas sim como  uma estrada da vida .
 
A  CAVALGADA

A lua banha a solitária estrada...
Silêncio!... Mas além, confuso e brando,
O som longínquo vem-se aproximando
Do galopar de estranha cavalgada.

São fidalgos que voltam da caçada;
Vêm alegres, vêm rindo, vêm cantando.
E as trompas a soar vão agitando
O remanso da noite embalsamada...
 
E o bosque estala, move-se, estremece...
Da cavalgada o estrépito que aumenta
Perde-se após no centro da montanha...
 
E o silêncio outra vez soturno desce...
E límpida, sem mácula, alvacenta
A lua a estrada solitária banha...

Raimundo Correia  expressa neste soneto um fenômeno da bela natureza  com  o término do dia  dando lugar à noite . Em um movimento que atua como uma sequência  cênica , o Poeta , usando de vários recursos de linguagem figurada , vai construindo  a passagem com todos os seus aspectos visualizados  e sentidos  nas significações das palavras que compõem o poema .
                            
 
ANOITECER

Esbraseia o Ocidente na agonia
O sol... Aves em bandos destacados,
Por céus de ouro e púrpura raiados,
Fogem... Fecha-se a pálpebra do dia...

 Delineiam-se além da serrania
 Os vértices de chamas aureolados,
 E em tudo, em torno, esbatem derramados
 Uns tons suaves de melancolia.

Um mundo de vapores no ar flutua...
Como uma informe nódoa avulta e cresce
A sombra à proporção que a luz recua.

A natureza apática esmaece...
Pouco a pouco, entre as árvores, a lua
Surge  trêmula, trêmula.... Anoitece.

             
 
As linhas poéticas de “ Plena  Nudez “ deixam transparecer as verdadeiras caracterizações do estilo Parnasiano como : a rigidez na forma , exaltação à cultura clássica  e a obediência às regras na composição da poesia . O poema fala sobre as esculturas pagãs gregas de enorme caráter sexual  , realçando o estado nu nos seus mais comuns  termos , expressos poeticamente na última estrofe da poesia .
 
 
PLENA NUDEZ

Eu amo os gregos   tipos de escultura:
Pagãs nuas no  mármore   entalhadas;
Não essas produções que a estufa escura
Das modas  cria , tortas e enfezá-las.
 
Quero em pleno esplendor, viço  e  frescura
Os corpos nus; as linhas onduladas
Livres; da carne exuberante e pura
Todas as saliências   destacadas ...
 
Não quero, a Vênus opulenta e bela
De luxuriantes formas, entrevê-la
Da transparente túnica através:
 
Quero vê-la, sem pejo, sem receios,
Os braços nus, o dorso nu, os seios
Nus...  toda  nua , da cabeça aos pés !

 
No soneto  abaixo , Raimundo Correia conota expressões poéticas contidas no decorrer  do  poema  “ BONZO “ , palavra usada pelos negros para descrever a saudade deprimente que eles sentiam da terra natal . A poesia  menciona , através de termos figurados ,  uma visualização  da lembrança memorizada nos momentos  saudosos  de seus territórios naturais :  a África ,  como : “ céu bem azul “ , “ Rio Níger , comparado a uma serpente dourada “ , “ leões bramindo “ , “ elefantes derrubando árvores “ , tudo reportando a tristes recordações que os escravos guardavam com  “  visões mortais “ , ao olhar o céu azul ,  exilados em território brasileiro .
             
“BONZO"

Visões que na alma o céu do exílio incuba,
Mortais visões! Fuzila o azul infando...
Coleia, basilisco de ouro, ondeando
O Níger... Bramem leões de fulva juba...

Uivam chacais... Ressoa a fera tuba
Dos cafres, pelas grotas retumbando,
E a estrelada das árvores, que um bando
De paquidermes colossais derruba...

Como o guaraz nas rubras penhas dorme,
Dorme em nimbos de sangue o sol oculto...
Fuma o saibro africano incandescente...

Vai com a sombra crescendo o vulto enorme
Do baobá... E cresce na alma o vulto
De uma tristeza, imensa, imensamente
...
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