O CANTINHO POÉTICO dedicará neste espaço um tipo de literatura próprio dos poetas populares do Nordeste brasileiro , que expõem , em suas artes , uma técnica de improviso através de seus folhetos : “ LITERARURA DE CORDEL“ . Sobre sua origem , sabe-se apenas que foi assimilada em Portugal antes do século XVII . Como definição , é uma espécie de poesia popular que é impressa e divulgada em folhetos ilustrados com o processo de xilogravura . Ganhou o nome de CORDEL , porque são expostos ao povo amarrados em cordões que são estendidos em pequenas lojas de mercados populares ou até mesmo nas ruas . Suas expressões e temas literários são originados do povo que sugere aos artistas populares , dentro de uma sensibilidade criativa , aguçada observação nos problemas vivenciados na sociedade , transcrevendo –os em seus versos . No folclore existe uma parte que é chamada de literatura oral e dentro dela temos a poesia .
Literatura de cordel
Começaremos definir os vários significados resultantes do exame de temas e textos do mundo do cordel . Primeiramente faremos uma abordagem no campos da religião , aí os folhetos são verdadeiros ecos do povo ao se apegar aos protetores , guardiães , como Padre Cícero Romão , conselheiro de todas as horas , como protetor dos humildes e pobres .
Apresentaremos inicialmente um poeta tradicional na literatura de cordel brasileira , possuidor de um senso criativo dentro da Cultura Popular : JOTA RODRIGUES . Seus versos percorrem os temas mais recorrentes , retratando o cotidiano da sociedade brasileira , da vida urbana e rural , da política e das condições sociais . Como todo poeta de cordel , Jota Rodrigues está sempre atento aos problemas da saúde e da educação do povo brasileiro . Suas publicações versam em torno de 400 títulos escritos e formatados em uma máquina impressora velha nos fundos de seu quintal em Morro Agudo , distrito de Nova Iguaçu , Estado do Rio de Janeiro .
Analisaremos alguns fragmentos da vasta galeria poética de JOTA RODRIGUES . Lembramos que o Poeta nunca frequentou bancos escolares e aprendeu as formas das letras copiando e cobrindo com carvão nas calçadas , logo , o esboço crítico sobre os deslizes da língua portuguesa não terá nenhum fundamento , se a leitura obedecer somente à mensagem em forma de arte, então , já é importante para os conceitos literários e para a satisfação de uma boa leitura .
Durante uma palestra dada na Universidade Iguaçu , alguns acadêmicos solicitaram ao poeta a sua visão sobre folclore , e ele atendeu em forma de improviso , formatando depois para o folheto . Com a praticidade dos problemas culturais observados durante a trajetória de sua vida , Jota Rodrigues esboça em seu folheto versos que conceituam o folclore em :
“ O QUI É O FOLCLORE DO MEU BRASIL “
OU SENHORA APARECIDA COM VOSSOS PODERES MIL AJUDAIME A DISCREVER O QUE AS ESCOLAS MI PIDIU UM JEITO QUI SE COMEMORE AS RIQUEZAS DO FOLCLORE DO NOSSO IMENSO BRASIL .
O FOLCLORE REPRESENTA A MAIOR FESTA VERDADEIRA VIVIDA PELA UMANIDADE DESDE A GERAÇÃO PRIMEIRA É AS GRANDES FESTIVIDADES DE REMOTA ANTIGUIDADES DESTA NAÇÃO BRASILEIRA
E A QUASE SETENTA ANOS NO FOLCLORES EU PERMANEÇO POREM DESCREVELO A FUNDO O PRIVILEGIO NÃO MEREÇO MAIS COM TODA ONESTIDADE DISCREVO DELE A VERDADE COMO O VIVI E O CONHEÇO .
O povo nordestino ainda procura resgatar a verdadeira história sobre LAMPIÃO , deformada por um mar de exageros e mentiras lançadas pelas elites . Neste cordel Jota Rodrigues narra uma clara e justa história sobre o homem mais destemido do Nordeste .
“ LAMPIÃO NÃO FOI BANDIDO “
LAMPIÃO NÃO FOI BANDIDO OU MARIA DE NAZARÉ DAIME RIMA E INSPIRAÇÃO PRA QUI EU NESTE CORDEL DESCREVA COM EXATIDÃO LAMPIÃO NÃO FOI BANDIDO MAIS UM VINGADOR TRAIDO PELAS LEIS DESTA NAÇÃO
REVISTA RADIOS JORNAIS CINEMA TELEVISÃO E POETAS CONCEITUADOS MODELARO UM LAMPIÃO DE TERROR E BARBARISMO COVARDIA E BANDITISMO UM DETESTAVEL LADRÃO
MAIS LAMPIÃO NÃO FOI BANDIDO COVARDE MONSTRO OU LADRÃO MININO POBRE QUI NA INFANCIA VIVERA COM OS PES NO CHÃO E QUI NASCERA COM UM OLHO BAIXO E OS OUTROS MININOS AOS CAIXO FASILE UMILIIAÇÃO .
Nos versos do folheto “ Favelas berços dos injustiçados “ , Jota Rodrigues retrata os casos de sofrimento dos moradores das favelas que conseguem retomar a alegria apesar de tanta covardia e miséria .
“ FAVELAS BERÇOS DOS INJUSTIÇADOS “
BOM JESUS MESTRE DOS MESTRES E DEFENSOR DOS DESPRESADOS CONCEDEIME INSPIRAÇÃO QUI VOU NESTES VERSOS RIMADOS EM MENSAGEM SIMPLE E SINGELA DESCREVER NOSSAS FAVELAS BERÇOS DOS INJUSTIÇADOS
FAVELAS JÁ VIROU MODA EM NOSSO BRASIL AMADO SETE LETRAS QUI EXPRESSA O NOSSO PAIZ ADORADO TODO DIA SURGE UMA POREM NÃO HÁ QUEM ASSUMA O SEU CRESCIMENTO ADOIDADO
TODO MAL TEM SEU COMEÇO DIZ O PROVERBIO ASSIM AS FAVELAS TEM NASCENTES DOS FAZENDEIROS RUIM QUI IMPONHEM AO LAVRADOR MISERIA FOME E TERROR COM AS AMBIÇÕES DE CAIM
Depois de trabalhar anos e anos produzindo para a sociedade , o idoso sofre maiores humilhações . Jota Rodrigues pinta uma quadro do descaso que sofre a terceira idade através do folheto :
“O DISCRIMINADO IDOZO “
DEUS QUI FEZESTE DE MIM UM POETA CAPRICHOSO DAIME LUZ INSPIRAÇÃO E UM ROTEIRO VENTUROSO PARA QUI EU POSSA DESCREVER O DESPRESO E O SOFRER DO DISCRIMINADO IDOZO .
NO BRASIL DE CANTO A CANTIO O PRECONCEITO É UM SÓ OS IDOZOS SÃO TRATADO COMO CACHORRO COTÓRO OU UM VELHO BOI CANÇADO QUI NO MATADOURO É JOGADO PARA O ABATE SEM DÓ .
QUANDO O BOI DE CARRO É NOVO TEM A FORÇA DE UM SANSÃO ARA A TERRA ABRE ESTRADA PUCHA AS TORAS DO GROTÃO E NAS SERRAS E NAS CORDILHEIRA TRANSPORTA COLHEITAS INTEIRAS PRA OS ARMAZENS DO PATRÃO
OBS.) TODOS OS FRAGMENTOS FORAM RETIRADOS DA “ PRIMEIRA ANTOLOGIA DE CORDÉIS “ DE JOTA RODRIGUES , EDITADA PELO CENTRO INTERCÂMBIO CULTURAL “ MARTI POPULAR “.
Agora abriremos espaço para apresentação de alguns fragmentos dos folhetos do cordelista mais antigo da Feira de São Cristóvão : José João dos Santos mais conhecido como MESTRE AZULÃO . Poeta experiente , morador do Rio de Janeiro , foi um dos principais fundadores da feira nordestina de São Cristóvão (RJ), como ele mesmo conta no seu livreto “A feira nordestina, foi assim que começou” . É na própria feira que ele possui sua barraquinha de cordéis, onde os vende em grande quantidade.
Quem quiser saber da feira Venha pra perto me ouvir Que vou contar em detalhes Sem aumentar nem mentir Mas num falar positivo Vou explicar o motivo Da nossa feira existir
No ano quarenta e nove Vim pro Rio a vez primeira Fui visitar São Cristóvão Então por esta maneira Sem de nada conhecer Depois eu pude entender O começo desta feira
Morador da Baixada Fluminense , Azulão , em sua trajetória rumo à Feira de São Cristóvão, era usuário constante dos trens , o que lhe permitia vivenciar com os comportamentos daquele ambiente , daí brotavam situações que inspiravam o poeta criar seus folhetos
O trem da madrugada Leitores trago mais uma Criação muito engraçada Da minha lira poética Que sempre vive afinada Desta vez descrevo bem O movimento do trem Que desce de madrugada Seja de Paracambi São Mateus ou Santa Cruz A turma da fuleragem Que só bagunça produz De madrugada só quer Carro que tem mais mulher Porta enguiçada e sem luz
Em tema bem atual , Azulão , com senso crítico , demonstra em seus versos um enorme descontentamento com os políticos brasileiros , por causa das descobertas das corrupções que escandalizaram o país . Apresentamos apenas as 12ª. e 13ª. estrofes do folheto :
“ CPI , MENSALÃO E RATOS BRASILEIROS “
Se apodera de muitos corações Pra tomar volumosas proporções No caminho do luxo e do prazer Todo mundo quer ouro, quer crescer Com a máfia da vil corrupção Suga o povo e os cofres da nação Que estão explorados e falidos E o Brasil dominado por bandidos Quanto mais poderoso mais ladrão”
“Potentado nem um vai pra cadeia Num país que só há democracia Para a classe da alta burguesia Que está sempre de mala e bolsa cheia Só o pobre vai preso e leva peia Quando rouba alguma coisa pra comer Mas o rico é o dono do prazer Amparado por todo esse regime Mata, rouba, faz tudo quanto é crime Equipado nas armas do poder” ( 12º e 13º estrofes de CPI, Mensalão e ratos brasileiros ) A farta “ matéria prima “ que sustenta e molda esta exemplar expressão literária está presente naquele que lê , que escreve , que ouve casos e os conta , perpetuando , assim, a nobre arte popular do cordel .