26/04/2015 às 09h11min - Atualizada em 26/04/2015 às 09h11min

Jerônima Mesquita: uma leopoldinense na luta pelos direitos da mulher no Brasil

Natania Aparecida da Silva Nogueira
Jerônima Mesquita nasceu na Fazenda Paraíso, distrito de Providência.

     Jerônima Mesquita nasceu em Leopoldina, Minas Gerais, no dia 30 de abril de 1880, na Fazenda Paraíso, distrito de Providência. Seu pai, José Jerônimo de Mesquita, era filho do maior comerciante de escravos para Minas Gerais. Sua mãe, Maria José Vilas Boas de Siqueira Mesquita, nasceu na fazenda da Glória, em Angustura, no dia 28 de janeiro de 1862. Era filha de Josefina Vilas Boas de Siqueira, de uma família de fazendeiros, e do cafeicultor Antônio Antunes Siqueira (1808-1874).

 

Maria José casou-se jovem, aos 18 anos, com José Jerônimo de Mesquita. Também foi uma jovem viúva, aos 34 anos, quando passou a se dividir entre a Europa e o Brasil, acompanhado os estudos dos filhos e ela mesma aprimorando seus conhecimentos. Tinha residência no Rio de Janeiro, no Flamengo, onde recebia amigos e convidados, muitos deles pessoas de destaque na sociedade, artistas e políticos.

     Participou, junto com a filha Jerônima, de muitas atividades de assistência social e de movimentos feministas. Integrou o grupo das Damas da Cruz Verde, responsável pela criação da maternidade Pró-Matre, no Rio de Janeiro, em 1918. O grupo prestava serviço assistencial no combate à gripe espanhola, na cidade do Rio de Janeiro. Maria José usava sua influência para arrecadar fundos para obras de caridade, mas muitas vezes o capital vinha de seus próprios recursos. Faleceu em 1953, com 91 anos.

DA ARISTOCRACIA À LUTA PELOS DIREITOS DAS MULHERES

Jerônima perdeu o pai aos 15 anos. Aos 17 anos casou-se, por imposição da família, com seu primo - Miguel Manuel Martins, filho do Barão de Itacuruçá e da Baronesa Francisca Eliza de Mesquita, irmã do seu pai. Segundo o memorialista Kenneth Lynch Light, sobrinho de Jerônima Mesquita, o casamento fora arranjado com o objetivo de preservar e ampliar o patrimônio da família.

    O casamento, no entanto, durou pouco tempo. Aos 20 anos de idade, ainda no final do século XIX, Jerônima separou-se do marido. Teve um filho, Mario Martins, que faleceu em um acidente de trânsito, por causa da neve e do gelo, nos Estados Unidos. Ele foi casado com uma norte-americana, Louise Hall. Tiveram uma filha, Maria Luísa de Mesquita Hall que nunca se casou e sempre viveu na Califórnia.

    A separação da filha é apontada como sendo uma das razões que levaram a Baronesa de Bonfim a morar na Europa por alguns anos com todos os filhos. Foram para a França e em Paris se instalaram no mesmo hotel onde Santos Dumont morava, na avenida Champs Elysèes. Lá permaneceram por aproximadamente 10 anos, até o início da Primeira Guerra Mundial, quando Jerônima ingressou como voluntária da Cruz Vermelha de Paris e depois serviu à Cruz Vermelha Suíça. Foi neste período que ela absorveu as ideias que, mais tarde, iria introduzir no país natal.

     Ao retornar ao Brasil, tornou-se ativista na luta dos direitos da mulher, juntamente com as amigas Stela Guerra Duval e Bertha Lutz , que conheceu na França. Amiga de Jerônima, Stella foi uma das fundadoras do Pro Matre. Por ocasião do surto de gripe espanhola, em 1918, Stela, a Baronesa e Jerônima coordenaram a assistência às vítimas da epidemia na cidade do Rio de Janeiro, quando se improvisaram enfermarias de emergência em todas as salas dos hospitais. Dessa experiência nasceu o projeto da maternidade Pró-Matre, fundada por elas.

 

  

Arquivo pessoal de Kenneth Light. Jerônima sentada à direta.

     Jerônima Mesquista foi uma das fundadoras da Federação Brasileira pelo Progresso Feminino (FBPF) em 1922. A Baronesa Maria José Vilas Boas de Siqueira Mesquita ajudou a filha em diversas ocasiões, comparecendo sempre aos eventos organizados pela FBPF ou recepcionando celebridades convidadas pela Federação a integrar os congressos feministas realizados no Rio de Janeiro (1922, 1931 e 1936)[5].

Jerônima foi, ao lado de Bertha e Stela, uma das pioneiras na luta pelo direito ao voto feminino no Brasil, atuando no movimento sufragista de 1932. Com Bertha Lutz e Maria Eugênia, em 14 de agosto de 1934[6] lançou um manifesto à nação, chamado de Manifesto Feminista. Juntamente com um grupo de companheiras fundou, ainda, o Conselho Nacional das Mulheres, em 1947, no Rio de Janeiro, uma organização cultural não governamental, que tem por objetivo em defesa da condição da mulher.

Aos 29 anos foi responsável pela fundação do Movimento Bandeirante no Brasil, em 1919, como reflexo das mudanças ocorridas no decurso da I Guerra Mundial, quando a mulher alcançou certa emancipação por ter participado de responsabilidades até então reservadas exclusivamente aos homens. As atividades eram basicamente as aulas de primeiros socorros, enfermagem e puericultura.

     Originalmente o nome da organização era Federação Brasileira das Girl Guides no Brasil. O nome foi adaptado pelo professor Jonathas Serrano, que procurou dar a ele um sentido pioneiro. Por isto o nome Bandeirante, que simbolizava a abertura de novos caminhos para a participação das mulheres na sociedade brasileira.[7] Tratava-se de uma iniciativa incomum, considerada por alguns como escandalosa para a época, pois a ideia de um grupo de mulheres se uniformizar e se reunir para atuar em um movimento era vista com desconfiança.

Jerônima destacou-se por sua atuação como feminista, sufragista e assistente social. Foi uma mulher de fibra que não se deixou intimidar pelas regras sociais elaboradas e impostas pelos homens. De família rica, dedicou sua vida a ajudar mulheres que tinham muito menos que ela. Andou entre doentes e ajudou a aplacar a dor dos feridos durante a I Guerra Mundial. Buscou justiça através da igualdade de homens e mulheres perante a lei. Sua luta e de suas companheiras, como Bertha Lutz, permitiram que muitos avanços sociais e políticos fossem conquistados pelas mulheres no Brasil.

      O direito da mulher ao voto era considerado, para muitos, uma utopia. Não é que se fizesse uma proibição direta no Brasil e em outros países, durante o século XIX e a primeira metade do século XX. Na verdade, as mulheres não eram consideradas cidadãs, logo, não se encaixavam numa das condições exigidas dos eleitores. A conquista do direito ao voto, portanto, caminha lado a lado com a conquista dos direitos de cidadania, concedidos apenas aos homens, e que na Itália, por exemplo, só veio com a Constituição de 1948.

      Depois de tantas décadas de luta pelos direitos da mulher e contra a injustiça, a leopoldinense Jerônima Mesquita faleceu na cidade do Rio de Janeiro, onde morava, em 1972.  Quando foi finalmente aprovada a lei que instituía o Dia Nacional da Mulher, ficou decidido que este dia seria 30 de abril, data de seu nascimento.

*Mestre em História, especialista em História do Brasil, membro da Academia Leopoldinense de Letras e Artes e professora da Educação Básica no município e Leopoldina (MG).

REFERÊNCIAS

BIOGRAFIA de 2º Barão de Bonfim José Jerônymo de Mesquita. Disponível em: , acesso em 10 jul. 2009.

BONATO, Nailda Marinho da Costa. A educação das mulheres no pensamento da Federação Brasileira pelo Progresso Feminino (1922-1931). VI Congresso Luso-Brasileiro de História da Educação: percursos e desafios da pesquisa e do ensino de História da Educação. Programação e resumos. Uberlândia: ANPED-SPCE-SBHE-UFU, 2006. p.1371. Disponível em: , acesso em 10 jul. 2009.

D. JERÔNYMA Mesquita (1880-1972). Disponível em: , acesso em:  09 jul. 2009.

JERÔNIMA Mesquita (1880-1972). Disponível em <http://zip.net/bdq6fL >, acesso em 10 jul. 2009.

NASCIMENTO, Jorge Carvalho do. A propósito dos 80 anos de uma reforma: Atílio Vivaqua e o escotismo escolar no Espírito Santo. Disponível em: , acesso em 11 jul. 2009.

SCHUMA, Schummaher, BRASIL, Érico Vital(org). Dicionário Mulheres do Brasil: de 1500 até a atualidade biográfico e ilustrado. – Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2000.

SOIHET, Rachel. A pedagogia da conquista do espaço público pelas mulheres e a militância feminista de Bertha Lutz. Revista Brasileira de Educação, nº 15, 2000. p. 112.

 

 

 

 

 

 

 

[7] D. JERÔNYMA Mesquita (1880-1972). Disponível em: , acesso em:  09 jul. 2009.


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