O funcionário do Ministério da Agricultura, lotado na Escola Modelo de Pedro Leopoldo, Francisco de Paula Cândido (Em 1966, mudaria para o nome paterno de Francisco Cândido Xavier). O médium Chico Xavier, (O terceiro da esquerda para a direita) sempre visitava Leopoldina a serviço quando da realização da Exposição Agropecuária.
De acordo com o relato do professor Zanoni Araujo, em uma dessas visitas, Chico e seu supervisor Dr. Rômulo Joviano, se dirigiam ao Centro Espírita Amor ao Próximo, onde todos já o esperavam aguardando as mensagens psicografadas que seriam recebidas até altas horas da noite.
Dr. Rômulo era seu secretário na mesa de psicografia, fazendo pontas em lápis e trocando as folhas psicografadas. Pelo menos em duas ocasiões (1940 e 1947) sonetos atribuídos ao espírito de Augusto dos Anjos foram psicografados por Chico em Leopoldina . Estes foram incluídos em novas edições do livro "Parnaso de Além Túmulo"
GRATIDÃO a LEOPOLDINA*.
Sem o vulcão de dor de hórridas lavas, Beija, augusto, este solo generoso, Que te guardou no seio carinhoso O escafandro das células escravas.
Aqui, buscaste o campo de repouso, Depois de vagas ríspidas e bravas No mundo áspero e vão, que detestavas, E onde sorveste o cálice amargoso.
Volta, augusto, do pó que envolve as tumbas, Proclama a vida além das catacumbas, Nas maravilhas dos seus resplendores.
Ajoelha-te e lembra o último abrigo, Esquece o travo do tormento antigo E oscula a destra de teus benfeitores.
· Poesia recebida em 18 de junho de 1940, em Leopoldina, onde foi sepultado o poeta.
RECORDAÇÕES EM LEOPOLDINA(*) Augusto dos Anjos
A sombra amiga destes montes calmos, Meu pobre coração de anacoreta, Amortalhado em fina roupa preta, Desceu à escuridão dos sete palmos.
Viera o fim dos sonhos intranquilos, Entre grandes e estranhos pesadelos, Satisfazendo aos trágicos apelos Da guerra inexorável dos bacilos.
A morte terminara o horrendo cerco, Sufocando as moléculas madrastas... Eram milhões de células nefastas, Voltando à paz do túmulo de esterco.
Indiferente aos últimos perigos, Meu corpo recebeu o último beijo E comecei o lúgubre cortejo, Sustentado nos braços dos amigos.
Em triste solilóquio no trajeto, Espantado, fitando as mãos de cera, Rememorava o tempo que perdera, Desde as primárias convulsões do feto.
Porque morrer amando e haver descrido Do Eterno Sol, do qual vivera em fuga? Como é sombrio o pranto que se enxuga Pelo infinito horror de haver nascido!...
Depois, vi-me no campo onde a dor medra, Ao contato do chão frio e profundo, Chegara para mim o fim do mundo, Entre as cruzes e os dísticos de pedra.
Terrível comoção pintou-me a cara, Na escabrosa cidade dos pés juntos, Tornara-se defunta, entre os defuntos, Toda a ciência de que me orgulhara.
Trêmulo e só no leito subterrâneo, Sentia, frente à lógica dos fatos, O pavor dos morcegos e dos ratos, Dominar os abismos de meu crânio.
Meus ideais mais puros, meus lamentos, E a minha vocação para a desgraça Reduziam-se a mísera carcaça Para o açougue dos vermes famulentos.
Em seguida o abandono, enfim, do plasma, Os micróbios gritando independência... E tomei nova forma de existência Sob a fisiologia do fantasma.
Fugindo então ao gelo, à sombra e à ruína. Do caos sinistro em que vivi submerso Revelou-se-me a glória do universo, Santificado pela Luz Divina.
Oh! Que ninguém perturbe os meus destroços, Nem arranque meu corpo à última furna, É Leopoldina a generosa urna, Que, acolhedora, me resguarda os ossos.
Beije minhalma alegre o pó da rua, Deste painel bucólico e risonho, Onde aprendi, no derradeiro sonho, Que o mistério da vida continua...
Bendita seja a Terra, augusta e forte, Onde, através das vascas da agonia, Encontrei em mim mesmo, em novo dia, Pelas revelações de luz da morte.
(*) Espírito: Augusto dos Anjos -Psicografia de Francisco Cândido Xavier Recebida em 17 de julho de 1947