08/01/2016 às 08h23min - Atualizada em 08/01/2016 às 08h23min

MINHA MÃE

Perguntaram a uma criança qual seria, na sua opinião, a maior invenção. "Minha mãe, respondeu".  
 
Hoje é dia de homenagearmos as Mães.  A minha se chamava Cenira, que possuía todos os atributos e defeitos de uma boa mãe.  Era uma tremenda "coruja", que dizia que não me superprotegia, que não me tratava como filho único, etc, o que talvez não fosse muito verdadeiro.  Quantas vezes, ao chegar em casa de madrugada, encontrei-a à minha espera: "Meu filho, como foi a festa? Tem café no bule, leite na geladeira, e fiz uns biscoitinhos para você, que estão no armário da copa".  Eu questionava: "Mamãe, são quatro horas da madrugada, você deveria estar dormindo".   "Eu estava sem sono, acordei quando você entrou", respondia ela, negando que estivesse aguardando minha chegada.  Nunca apanhei. Usava técnicas extremamente eficientes para disciplinar e estabelecer limites. Exemplificamos. Uma noite, eu e meu primo Eduardo fomos dar uma volta. Tínhamos em torno de seis anos. Ao passarmos em frente ao cinema, tomamos conhecimento que o filme daquela noite se chamava o "O Ouro Escondido", e era estrelado por Tom Mix, um de nossos ídolos.  Estávamos namorando o cartaz, quando fomos convidados pelo dentista da família para assistir ao espetáculo.  A sessão acabou às nove horas da noite.  Ao chegarmos em casa, nossas famílias estavam transtornadas, e já haviam nos procurados por toda a cidade.  Eduardo morava em frente à minha casa.  Minha mãe levou-me para a varanda do segundo andar, e ali fiquei durante uma hora, ouvindo os berros do meu amigo, que estava sendo devidamente castigado.  Ao terminar o choro, minha mãe simplesmente disse "Pode ir dormir". Nunca mais fugi.  Costumava ficar horas recostado no seu colo, conversando, até que eu adormecesse.  Hoje vejo o mesmo quadro, protagonizado por   meu filho Luis Felipe e minha esposa Beth.  Costumo dizer-lhe "Não tenho inveja, porque tive uma mãe igual à sua”. Com 50 anos, minha mãe ainda me chamava de "filhote”, como se eu fosse uma criancinha.    Ao visitar seu túmulo, logo após sua morte, acercou-se de mim um amigo, o Geraldo e disse-me: "Nunca vi uma mãe amar tanto um filho, como a D. Cinira amou o senhor". " Eu também não", respondi-lhe.  Graças a você e ao meu pai tive uma infância feliz e dela sempre me recordo com saudade.
 
Por que a mães merecem esse reconhecimento por parte dos filhos? Por vários motivos. No início da vida, mãe e filho são "dois seres numa só pessoa", o que deu origem à frase, “carne de minha carne".   É ela quem recebe o nosso primeiro olhar, primeiro sorriso, primeira gracinha e a primeira palavra que pronunciamos é “mamã".  O amor é uma via dupla entre mãe e filho, que começa antes do nascimento, pois o feto já é sensível às emoções maternas, já tem capacidade de sentir-se amado ou rejeitado.  Cortado o cordão umbilical, essa união continua, de tal forma que hoje reconhece-se uma gestação intra-uterina e outra extra-uterina, tal a dependência da criança de sua mãe. Nos primeiras semanas e meses de vida.  Dela receberá o alimento necessário para o seu corpo - o leite e para sua alma - o afeto. De "dois seres em uma pessoa", passa a ser "um só ser em duas pessoas". 
 
Em torno do amor materno é que se organizarão as relações afetivas da criança, primeiro com ela, em seguida com os outros membros da família. Embora   amar seja seu papel primordial, a mãe ainda é a grande responsável pelo crescimento físico e pelo desenvolvimento mental e emocional dos filhos, sem queremos negar o importante papel desempenhado pelo pai.  O amor materno é benevolência, ternura e compreensão, ou seja amor de intuição, de manifestação e de aceitação; sua característica mais forte é ser incondicional, não exigir nada em troca.  Com a segurança e a estabilidade constitui os pilares essenciais para o bom desenvolvimento emocional dos filhos. E a mãe é quem   mais contribui na família para que o filho cresça em um ambiente em que existam estas três condições.  Entretanto, convém lembrar que a sua influência sobre os filhos depende mais do que ela é, do que ela diz; fazer e ser é, na verdade, muito mais importante do que dizer, principalmente na formação dos valores, dos princípios, do denominado "berço".  Embora seja uma atribuição do casal, a mãe, por sua convivência mais estreita e amorosa com o filho, tem mais oportunidades de ensinar-lhe os valores - honestidade, sinceridade, auto-estima, limites, disciplina, fidelidade, lealdade, respeito, amor, generosidade, cordialidade, justiça e perdão.  Minha mãe soube ensinar-me tudo isso com ternura, com carinho, com palavras e principalmente com atos.  E por que os pais devem ensinar valores aos filhos?   Por ser a melhor e mais eficiente maneira de assegurar-lhes uma existência feliz.
 Dedico sempre minhas lembranças às mães de minha vida: D. Sinhazinha, minha avó, Cinira, minha mãe, Lelena, minha vizinha que me tratava como filho, Judith, minha primeira professora, Therezinha, minha primeira esposa.  Minha homenagem a todas às mães que se dedicam de corpo e alma a cuidar de seus filhos, com um único objetivo: de que eles sejam felizes.
 
Meu carinho para Beth, minha esposa, que soube tão bem cuidar do Luis Felipe, dos enteados e meus filhos, Antonio Marcio, Antonio Carlos, Marcia e Claudia, e dos meus netos.
 
Hoje, 2 de janeiro de 2016, fazem trinta anos que perdi minha mãe. Ainda sinto a sua presença ao meu lado, principalmente nos momentos mais difíceis. Desejo que, em 2016, todas as crianças possam ter uma  Cinira, igual a minha, ao seu lado.
 
(*)Antonio Márcio Junqueira Lisboa, médico pediatra, escritor e professor universitário, é membro da ALLA-Academia Leopoldinense de Letras e Artes
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