05/11/2023 às 10h02min - Atualizada em 05/11/2023 às 10h02min

190 - A ORIGEM DA FAZENDA DOIS IRMÃOS DE ABAÍBA

Luja Machado e Nilza Cantoni
A origem da Fazenda Dois Irmãos de Abaíba pode ser parcialmente contada a partir do primeiro processo de divisão da propriedade onde se formou tal Fazenda. Um processo datado de 1881, que permitiu esclarecer a origem do território e o nome da propriedade. E tomar conhecimento que a Dois Irmãos era composta de duas sesmarias e de frações de Terras de Posse[1].

A primeira sesmaria, concedida[2] a Jesuina Francisca de Paula, medindo meia légua em quadra, correspondia a 225 alqueires de 4,84 hectares cada; a segunda, concedida[3] ao alferes José Ignacio da Silva Maior Souto, cujo nome correto é José Ignácio da Silva Souto Maior, com os seus aproximados 225 alqueires; e, as frações de Terras de Posse que ocupavam 236 alqueires.

Essas terras de posse serão mais bem conhecidas a partir do que se segue.

Primeira Sesmaria

A primeira sesmaria foi concedida a Jesuina Francisca de Paula em 21 de fevereiro de 1818 e localizava-se entre as serras Bonita, Feia, Limoeiro e Conceição. A primeira hipótese foi a de que poderia estar em terras que atualmente pertenceriam aos municípios de Pirapetinga ou Estrela Dalva.  Isto porque encontramos a Carta de Sesmaria junto ao processo de divisão de propriedade[4] requerido por Joaquim Dias Ferraz em 1894. Nesse processo encontra-se uma escritura de 11 de abril daquele ano em que Antonio Joaquim Vieira Cardoso, morador de Pirapetinga, vende para Joaquim Dias Ferraz a fazenda Vigillância que fora comprada de Sabino José da Silveira, morador de Estrela Dalva, no mês anterior. Como as confrontações da área transacionada nada esclareciam, por terem sido citados nomes de propriedades comuns na região, ficou a dúvida se a Dois Irmãos poderia ser por ali.

Partimos, então, para investigar quem foi a beneficiária daquela Carta. Quem era a senhora Jezuina Francisca de Paula, também referida como Jesuína Cândida de Paula? E nessa busca, segundo estudo[5] sobre seu pai, descobriu-se que Jesuína nasceu por volta de 1788, sendo a última filha de José Joaquim Corrêa, nascido na freguesia da Candelária, no Rio de Janeiro, filho de Antônio Francisco Costa e Isabel Maria de Jesus.

José Joaquim se casou com Francisca Antônia de Paula aos 21 de agosto de 1774, em São João del Rei. Ela, filha de Josefa Joaquina da Câmara, natural do Rio de Janeiro, neta materna de Antônio Martins Branco e Josefa Caetana da Rosa. Josefa Joaquina foi casada com Manoel Caetano de Azedias.  Separou-se e foi morar em São João Del Rei onde teve dois filhos: Francisca Antônia e Manoel Joaquim Marreiros.

Ressaltamos ainda que o Sargento Mor José Joaquim Corrêa recebeu sesmaria[6] no dia 12 de dezembro de 1817, no sertão do Paraíba aquém da Serra Bonita, no caminho para o Canta Galo e a Carta também se encontra anexada ao processo[7] da segunda divisão da fazenda Dois Irmãos. Além de Jesuína, suas filhas Mariana, Bárbara e Bernardina também receberam sesmaria[8] na mesma localização.

Estudo do Projeto Compartilhar informa que Jesuína Cândida de Paula se casou com o Capitão Mor João Pereira Pimentel que recebeu sesmaria[9] no dia 16 de fevereiro de 1818 no sertão do Paraíba, aquém da Serra Bonita, no caminho para o Canta Galo, sendo que a sesmaria não foi requerida por ele, mas por Bárbara Marcelina de Paula que era irmã de sua mulher Jesuína Candida de Paula.

É bom registrar, também, que no Auto de Medição e Demarcação da sesmaria recebida por Jesuina, de 09 de agosto de 1825, é citado o Ribeirão Pirapetinga. E que além do Auto de Posse, o processo de 1894 traz o Auto de Arrematação da sesmaria concedida ao marido de Jesuina, por Jacinto Manoel Monteiro da Cunha aos 28 de novembro de 1836. Provavelmente o Jacinto antes citado seria Jacinto Manoel Monteiro de Castro, avô materno de Jacinto Manoel Monteiro de Barros, um dos requerentes do primeiro processo de divisão da fazenda Dois Irmãos.

Segunda  Sesmaria

Segundo o processo[10] da primeira divisão da fazenda Dois Irmãos, a segunda sesmaria que constituía a fazenda foi a concedida[11] ao alferes José Ignácio da Silva Souto Maior aos 28 de fevereiro de 1818. E a indicação constante da carta informa que as terras ficavam no Sertão do Paraíba, entre as serras: Bonita, Feia, Conceição e Limoeiro.

Ao realizar os primeiros estudos sobre as sesmarias na região de Leopoldina, foi levada em consideração a informação[12] de Celso Falabella para quem Souto Maior está entre os que receberam sesmaria no Louriçal, Córrego Jacaré, Córrego Bom Jardim e no Sertão do Cágado. No entanto, no inventário[13] do beneficiado consta entre os bens de raiz “uma sorte de terras compradas ao Sargento Mor Antonio José de Barros e a seu filho Joaquim José de Barros, que se compõe de capoeiras e campos de criar 620$000”. 

Tais vendedores muito provavelmente eram os Monteiro de Barros e talvez tenha havido uma troca com terras de Manoel José Monteiro de Barros e seu filho José Joaquim Monteiro de Barros.

Interessante observar que Maria Vitória Ferreira de Jesus, primeira mulher de Souto Maior, também recebeu sesmaria no Sertão do Paraíba, entre Conceição e Serra Feia, no dia 02 de julho de 1818, fazendo divisa com a sesmaria recebida pelo marido quatro meses antes.

Medição  da  fazenda  Dois  Irmãos

No Memorial da medição da fazenda Dois Irmãos, em 1881, o agrimensor informou que a mesma compreendia duas Sesmarias e Terras de Posse, fazendo divisa com as fazendas da Soledade, Cachoeira, Harmonia, Santa Rosa e Moinhos. Mencionou os beneficiários originais das duas sesmarias e informou que a área delas era de 2.245 hectares e 77 ares, ou seja, aproximadamente 463 alqueires. E as Terras de Posse, segundo a medição, se estendiam por 1.147 hectares e 43 ares, o que corresponde a 236 alqueires, totalizando aproximados 699 alqueires. Considerou-se que o alqueire da região de Leopoldina equivalia a 4,84 hectares e que as sesmarias concedidas eram de meia légua em quadra ou 225 alqueires. A pequena diferença para mais nas terras da fazenda, medidas em 1880, pode ser creditada ao aprimoramento dos instrumentos de medição, e parece mais próximo da realidade dizer que a fazenda Dois Irmãos teria área equivalente a três sesmarias.

O  nome  Dois  Irmãos

Os requerentes da divisão em 1881 foram Antônio José Monteiro de Rezende e Jacinto Manoel Monteiro de Barros. Mas eles não foram os formadores da propriedade, já que Antônio José nasceu por volta de 1830, Jacinto Manoel nasceu em 1852 e eles não eram irmãos.

Antônio José Monteiro de Rezende era filho de Manoel Pereira de Rezende Alvim e de Agostinha Carolina Monteiro de Barros Galvão de São Martinho, sendo neto materno de Inês de Castro Galvão de São Martinho e Manoel José Monteiro de Barros Filho e por este, bisneto de Manoel José Monteiro de Barros e Margarida Eufrásia da Cunha Matos.

Jacinto Manoel Monteiro de Barros era filho de Maria da Conceição Monteiro de Castro e Vicente Ferreira Monteiro de Barros, sendo neto paterno de outra Maria da Conceição Monteiro de Castro e José Joaquim Monteiro de Barros e por este, bisneto dos mesmos Manoel José Monteiro de Barros e Margarida Eufrásia da Cunha Matos bisavós de Antônio José.

Sendo assim, a hipótese é a de que o nome da fazenda faz referência aos irmãos Manoel José Monteiro de Barros Filho e José Joaquim Monteiro de Barros.

Em 1880, no processo[14] de divisão da fazenda Harmonia, foi apresentada a certidão de venda feita por Jacinto Manoel Monteiro de Barros de um quarto de terras daquela fazenda em que ele declara que as terras foram havidas por herança de seu finado avô Jacinto Manuel Monteiro de Castro. E em 1881, no processo[15] de divisão das fazendas Cachoeira e Harmonia, há indícios de que ambas eram partes já desmembradas da fazenda Dois Irmãos.
 

A  segunda  Divisão

Em 1881 a fazenda Dois Irmãos pertencia a dois condôminos. Logo depois começaram as vendas de partes dos seus 700 alqueires. Muitas vezes eram partes bem pequenas, como os 6 alqueires vendidos a José Maria de Brito que os revendeu 1883, ou os 11 alqueires que Jacinto Manoel vendeu para Antônio José Monteiro de Rezende em 1882. Houve, também, adjudicação de parte da fazenda para pagamento de dívidas ao Barão de Porto Novo, hipoteca de outra parte para Macedo Sobrinho Abreu & Quartin e hipoteca ou venda de partes maiores pelos dois condôminos originais resultando em multiplicação dos condôminos que se tornaram 20 em 1894.

Além disso, durante a segunda divisão houve novas vendas de partes que foram devidamente delimitadas e registradas. Em 1896 restavam, por dividir, apenas as terras de 16 condôminos e os maiores quinhões passaram a ser o de Joaquim Dias Ferraz com 6.807.479 metros quadrados [680 hectares] e Marciana de Magalhães, viúva do Barão de Porto Novo, Luiz de Souza Brandão, com 5.420.800 metros quadrados [542 hectares]. Antônio José Monteiro de Rezende detinha 529.400 metros quadrados e Jacinto Manoel Monteiro de Barros dividia com Protásio Antônio Monteiro da Silva um quinhão de 2.906.419 metros quadrados.

Esclarecimentos  adicionais

As duas sesmarias e as Terras de Posse que compuseram a original fazenda Dois Irmãos estavam em território do antigo distrito do Feijão Cru, segundo João José da Silva Teodoro[16].

Em 1851 o território da fazenda passou a constituir o distrito de Conceição da Boa Vista. Em 1856, não houve registro das terras da fazenda.

Em 1884, na primeira divisão, continuava pertencendo a Conceição da Boa Vista. Em 1890, com a criação do distrito de Santa Izabel, o que restava da Dois Irmãos ficou para o novo distrito. Sua área foi representada da forma abaixo por ocasião do segundo processo de divisão.

 
 
Em 1926 a sede da outrora fazenda foi marcada[17] em território de Santa Izabel, atual Abaíba.

 

Fontes Consultadas

 

[1] Processo 38401515 Divisão da fazenda Dois Irmãos, autuação em setembro de 1881
[2] Arquivo Público Mineiro – APM - SC 377 página 46
[3] APM - SC 377 página 51
[4] Processo 38405205 Divisão da fazenda Dois Irmãos, autuação em janeiro de 1894.
[5] SETTE, Bartyra e JUNQUEIRA, Regina Moraes. Projeto Compartilhar. Sargento Mor José Joaquim Corrêa. Disponível em
. Acesso em 23 jul 2013.
[6] APM - SC 377  página 48
[7] Processo 38405205 Divisão da fazenda Dois Irmãos, autuação em janeiro de 1894.
[8] APM - SC 377 páginas 44, 45 e 47
[9] APM - SC 377 página 42
[10] Processo 38401515 Divisão da fazenda Dois Irmãos, autuação em setembro de 1881
[11] APM - SC 377 página 51
[12] CASTRO, Celso Falabella de Figueiredo. Os Sertões de Leste: Achegas para a história da Zona da Mata. Belo Horizonte:  Imprensa Oficial, 1987. pag. 57-58
[13] SETTE, Bartyra e JUNQUEIRA, Regina Moraes. Projeto Compartilhar. Inventário de José Inácio da Silva Souto Maior. Disponível em:
.  Acesso 16. 09.16
[14] Processo 38404728, divisão da fazenda Harmonia requerida por Custódio de Souza Pinto e outros. Img 172
[15] Processo 38406061, divisão da sesmaria da Cachoeira e metade da Harmonia, requerida por Lucas Antônio Monteiro de Rezende
[16] TEODORO, João José da Silva, Carta Topográfica dos Termos do Presídio, Pomba e São João Nepomuceno. Acervo da Biblioteca Nacional: 1847
[17] Commissão Geographica e Geologica de Minas Geraes. Carta Geográfica de Cataguases Folha nº 20 S2 E3 (São Paulo, Cayeiras e Rio: Secção Cartographica da Companhia Melhoramentos (Weisflog Irmãos incorporada), 1926.).
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