06/09/2022 às 23h23min - Atualizada em 06/09/2022 às 23h23min

Comemorações da Independência e o pior presidente da história do Brasil: qualquer semelhança é mera coincidência?

Edmundo Gouvêa Freitas (*)
Em tempos de torcida organizada na política corro o risco de ter meu artigo condenado, de plano, pelos negacionistas à leitura em razão da provocação no título e pela lamentável evidência do presente. Exatamente, por isso, optei pela flexibilização textual para trazer aos queridos leitores do JL uma conversa mais lúdica e cativante com a mistura de estilos narrativos para amenizar toda a constatação da destruição social, econômica e psicológica das pessoas em tempos tão sombrios.
 
Os aprazíveis passeios pela rua Barão de Cotegipe (João Maurício Wanderley - nobre, magistrado, político e membro do partido conservador no segundo reinado) coração da Mineira Gostosa - nos permite viajar no passado e, certa vez, algo me fez lembrar das comemorações do sete de setembro (feriado de Independência), quando, ao lado de meus amigos de infância, desfilava  pela Escola Estadual Professor Botelho Reis (Ginásio Leopoldinense).
 
Dando um salto temporal, difícil acreditar que a atual sociedade brasileira, tão prostrada aos “gritos roucos das ruas” (título da 2ª demo tape da banda leopoldinense de Hard Core na década de 90: ‘SCOOBY’), tenha fiel e sinceramente este sentimento cívico que os parciais algoritmos da pós-modernidade tentam impor de maneira tão, claramente, manipulada. Nas gerações anteriores, notadamente mais críticas e engajadas politicamente, a participação naqueles desfiles das escolas públicas comemorando a independência do Brasil era impulsionada, predominantemente, pela composição da nota dos discentes no terceiro bimestre (período em que os alunos mais dedicados já eram aprovados) e, em raríssimas exceções, pela livre manifestação da autonomia da vontade privada em uma comemoração tão militarizada e artificial.
 
Voltando novamente no tempo e apreciando o patrimônio cultural da cidade, comparando em meu, ainda que limitado, imaginário o período de ‘Atenas’ à ‘Apenas’ da Zona da Mata fui elencando algumas coincidências históricas que aqui denomino didaticamente de ‘pistas ao leitor’ para o inusitado ou previsível desfecho desta coluna (a conclusão será a livre manifestação da opinião de cada um de Vocês):
 
Foi deputado federal por vários mandatos; seu governo foi marcado por comemorações de centenário da independência do Brasil; foi eleito presidente em eleições terríveis e tumultuadas; sua campanha articulou informações falsas que influenciaram no resultado das urnas; ficou marcado pelo perfil autoritário, vingativo e envenenado pela campanha difamatória que havia sofrido; promoveu a incitação de militares contra as instituições; insistiu na manipulação do estado de sítio; decretou intervenção federal, apoiou a censura da imprensa; foi responsável pela prisão ilícita de adversários; contribuiu ao ‘empastelamento’ de jornais; sectário da tortura e do desrespeito aos direitos fundamentais; se valeu do cargo parlamentar no Congresso Nacional  como estratégia de obter imunidade parlamentar; considerado pela maioria o mais odioso e odiado presidente do Brasil, seus seguidores foram chamados de ‘B…istas’.
 
 
Com objetivo de descortinar a questão central que sustenta este texto reproduzimos trecho de discurso do redundante detentor do ‘título do título’ alhures:
 
“ (...) Vim para o governo da república por um propósito inabalável de servir a nação e assegurar-lhe a paz e promover-lhe o progresso, dentro da ordem e da lei, mas políticos ambiciosos e maus cidadãos não me tem deixado tempo para trabalhar, obrigando-me a consumi-lo quase todo em fazer política. (...)
 
E um congressista de oposição, ao final deste comentado mandato, subiu ao púlpito e declarou: “ (…) Mais do que meramente um retrógrado, ELE é quase um fanático pela fé religiosa, pela missão presidencial de que se julga investido (...)”
 
Assim, o personagem político - mistério do título - naquela conjuntura, ainda bravateou:
 
(…) Não estará ainda fresca na memória de todos como foi a nossa última campanha presidencial, nela se dizia que o candidato não seria eleito; se eleito, não seria reconhecido; se reconhecido não tomaria posse; se tomasse posse não poderia transpor os umbrais do palácio do catete [ leia-se, atualmente, palácio do planalto] (...)”.
 
Refletindo as ideias das pistas ao leitor ventiladas neste artigo, confesso que embora a curiosa similitude com o cenário contemporâneo, a informação da capital federal ainda como a cidade do Rio de Janeiro e não Brasília, bem como o bom domínio do vernáculo e persuasiva oratória me impediu de confundir a atual Presidência da República  com o (des)governo de Artur da Silva  Bernardes (1875-1955) - que me perdoem os Bernardistas, “ainda” considerado o pior presidente da história do Brasil. 
 
Por fim, esta científica colaboração ao Jornal Leopoldinense, afastando-se de qualquer predileção e\ou indireta campanha eleitoral,  tem meramente o status de utilidade pública de informar e esclarecer as massas sobre o que, de forma inequívoca,  está em jogo com a lamentável captura do “Dia 07 de Setembro” pelos inomináveis personagens da extrema direita que; não obstante esta data não representar, verdadeiramente, a Independência do Brasil (pensemos no 02 de julho baiano, nos povos negros e indígenas que não estão subscritos nesta data nacional), a usurpação dela, do mesmo modo que ocorre com as cores verde e amarelo; a bandeira nacional; o uniforme oficial da seleção brasileira etc, representa a perigosa organização do sistema simbólico que alimenta o viés político reacionário, não devendo a sociedade civil no Estado Democrático de Direito quedar-se inerte nas dinâmicas de ação para mostrar, em verdade, o tipo de história que o Povo quer e o Representante cuja coletividade é merecedora.
 
 
Edmundo Gouvêa Freitas é leopoldinense, professor externo da Universidade Estadual do Mato Grosso (UNEMAT), Advogado Master e Consultor Jurídico. 
 
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